2007/01/23

Um estado a perder o discernimento

The government is planning "behaviour orders" for people considered to be at risk of committing a violent crime.

[...]

Lord Chancellor Lord Falconer says the orders will not be an infringement on individual freedoms because there must be evidence before they are issued.

He told BBC News: "If there's evidence that you could commit a violent offence in the future, proper evidence of that proved in a court, then why shouldn't you be restrained from committing that violent offence.

"We are willing to do it relation to Anti-social Behaviour Orders, why not in relation to other sorts of offences as well."

As with Asbos, the standard of proof needed to issue the orders will be much lower than a criminal conviction requires.

The Sunday Times reported that "risk factors" that could lead to a person being subject to an order would include a person's upbringing, "cognitive deficiencies", "entrenched pro-criminal or antisocial attitudes", or "a history of substance abuse or mental health issues".

BBC News.
Lá nas terras da Britannia, o tino e o discernimento vão sendo progressivamente perdidos, numa espiral securitária e totalitária galopante. Progressivamente, substituem-se as regras do direito criminal, e o seu princípio de prova para além de uma dúvida razoável, por critérios de direito cível e de probabilidade na aplicação de decisões inibidoras da liberdades, à margem de qualquer processo judicial formal. Com a nova medida anunciada, vai-se já em direcção à sanção do thought crime, ou seja, não à sanção de acções individuais propriamente ditas, ou aplicação de medidas de coação para defesa da sociedade num tribunal criminal legitimado, mas sim a sancionar uma mera conjectura de alguém, no futuro, vir a cometer algum crime. Para além de institucionalizar o profiling social como meio legítimo de escrutinar e de aferir da perigosidade potencial de uns e de outros, desgraçados cujo único crime poderá ser terem nascido na família errada, ou no sítio errado.
The government has announced 40 "respect zones" in England which will receive extra funding to fight anti-social behaviour.

[...]

Mr Blair said there was a "small" number of families where "children haven't been brought up properly" and who made lives "hell".

He added: "We are not demonising them. We are simply asking that the local community can get to have the power to make these people conform [to expected levels of behaviour] or face the consequences."

BBC News.
Ou seja, face à confissão de não se conseguir garantir a Segurança e a Justiça por meios legítimos, criam-se autênticos tribunais plenários populares, ainda mais secundados, como se refere acima, por juízos de probabilidade, com poder para sancionar e restringir a liberdade de cidadãos. Premeia-se e alicia-se com dinheiro público comunidades que "mostrem serviço". Institucionaliza-se o vigilantismo, e abre-se uma Caixa de Pandora de onde poderão correr todos os instintos mais perversos das comunidades, desde o racismo à intromissão na privacidade dos vizinhos.

Estas pessoas estão a endoidecer? Estão a atirar pelo ralo todos os conceitos de Liberdade e de Estado de Direito por que lutaram, e que presidem aos sistemas jurídicos da generalidade dos países civilizados?

3 comentários:

Anónimo disse...

Minority report... life imitates art?... é realmente assustador. Qd li o 1984 (e ja q falei dele, o minority report tb) pensei que era mau mas realmente, aquilo não vai acontecer, não pode, as pessoas veriam aquilo a léguas de distancia e não deixariam.... mas cada vez que leio este blog e oiço certas noticias dá-me um aperto no estomago...

JLP disse...

Eu, sinceramente, o que me surpreende particularmente é serem os ingleses, que nunca foram muito de levar com a pata em cima, a aceitarem este género de coisas com o beneplácito e com a leveza do ser com que o estão a fazer.

Ainda mais num sistema político fortemente bipolarizado como o inglês, espanta-me que seja possível reunir consensos tão alargados, em que não há a mínima voz de relevo dissonante em torno destas questões.

E tenho pena que os Lordes não assumam um papel mais relevante (apesar de já o terem feito nalguns momentos chave), vindo a público e tomando as rédeas da defesa do Estado de Direito.

Espero que não a coisa ainda não tenha que chegar à Rainha...

Anónimo disse...

"...E tenho pena que os Lordes não assumam um papel mais relevante (apesar de já o terem feito nalguns momentos chave), vindo a público e tomando as rédeas da defesa do Estado de Direito."

Caro JLP

Os Lordes já não são bem o que eram...
Aí tentou-se acabar com "profiling social" e se calhar não foi boa ideia...
Não sei.
Mas eu sou um optimista em relação a Ingleses e Americanos.
Aí a termodinâmica politica funciona ao contrário - os sistemas evoluem para um estado de menor entropia.
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