2007/12/06

"Reguladores"

Veio hoje a lume a notícia de que está em consideração a mudança dos contadores de energia, e que para o efeito a ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos) apresentou uma proposta ao governo. De seguida analisa-se o seu conteúdo nos pontos essenciais e, quanto a mim, demonstra-se que mais uma vez o regulador se demite de uma perspectiva de isenção entre todos os intervenientes no mercado e que, mais, se demite de restringir o âmbito da sua intervenção a questões regulatórias e opta por avançar por questões que deveriam ser decisões da esfera dos intervenientes.

Em termos resumidos, é apresentado na proposta o seguinte quadro-resumo dos custos e benefícios da medida, que versa essencialmente introduzir a possibilidade de telecontagem/telegestão das instalações de consumo:



Focando na coluna dos benefícios, verifica-se que a generalidade destes vai na direcção dos distribuidores de energia, sendo que os benefícios para os consumidores se centram nas duas últimas linhas, nomeadamente "redução de consumos" e "alteração de hábitos de consumo". Ora já aqui se verifica o enviesamento da análise: a que propósito é que um regulador, de uma determinada área de mercado, sai das suas competências naturais de regulação do bom funcionamento desse mercado, para se alargar em considerações relativas aos moldes técnico-comerciais e às quantidades do bem que é transaccionado?

Alguém concebe um regulador de venda de laranjas a ditar considerações sobre se devem ser vendidas mais ou menos laranjas, de manhã ou à tarde? Acresce ao enviesamento o facto de se contraporem aos benefícios palpáveis e quantificáveis do lado dos distribuidores meras expectativas (não muito distintas de wishful thinking) de "mudanças de comportamento de consumo" que poderão originar no consumidor, expectativas estas genericamente pouco fundadas e mais do que atacáveis. Principalmente quando já é possível com a tecnologia de contadores existente ao consumidor acompanhar o seu consumo ou beneficiar de tarifas bi-horárias. O próprio regulador reconhece em parte o facto:

VALORIZAÇÃO DOS BENEFÍCIOS ASSOCIADOS À PROMOÇÃO DA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA

É consensual a dificuldade em quantificar a redução de consumos que pode ser atribuída à instalação dos novos contadores de energia, quer devido à natureza indirecta da relação entre o nível de informação dos consumidores e as suas decisões de consumo, quer sobretudo devido à falta de evidências experimentais aplicadas à realidade portuguesa neste domínio.

Todavia, é igualmente consensual que este benefício é um dos principais aspectos positivos dos sistemas de contagem mais sofisticados, primeiro enquanto canais de sensibilização dos consumidores quanto aos seus consumos e ao preço da energia, segundo enquanto facilitadores do desenvolvimento do mercado de equipamentos e serviços de eficiência energética.
Ou seja, anuncia-se como principal (e, diga-se, única) vantagem para os consumidores uma vantagem que se assume logo em seguida como sendo essencialmente imprevisível e não sustentada por qualquer evidência com o mínimo de critério científico. Ou seja, "espera-se" e "acha-se" que vai tudo correr bem, mas entretanto vão-se avançando com valores. Ora, colocando valores nos itens:



Vejam-se agora as conclusões:



Ou seja, são apresentados no seguimento das considerações anteriores, dois cenários: um "pessimista", que ignora os supostos benefícios do lado do consumidor, e em que são apresentados resultados catastróficos em termos de custos; um anunciado (por sua iniciativa) como "optimista", em que é apresentado um balanço positivo de 18 milhões de euros. Ou seja, 2,5% dos custos.

Qual é a decisão? Naturalmente avançar. Só que há um "pequeno" problema: é que esses custos vão ser essencialmente imputados ao consumidor, por via da tarifa imposta administrativamente. Ou seja, o risco corre por conta do freguês.

O regulador optou por promover a custo de funcionamento do mercado uma factura que deveria ser deixada como decisão técnico-comercial dos distribuidores, que repercutiriam como entendessem na sua operação esse custo.

Não há nenhuma razão técnica que suscite dúvidas, no presente, da funcionalidade e adequação dos contadores disponíveis em cumprir para com os contratos de fornecimento existentes. Não cumpre portanto a um regulador ser o percursor, ainda mais com distribuição muito criticável da factura, de "inovações" e "serviços", ou ser o técnico de marketing ou de operações dos distribuidores.

Aliás, mesmo de um ponto de vista técnico, fica patente a precipitação e são de questionar as decisões numa decisão com custos desta monta e com um horizonte de vigência anunciado como sendo de 20 anos: poder-se-ia dizer que um dos benefícios da troca de contadores poderia ser a adaptação destes ao novo enquadramento regulatório, que veio permitir entre outras coisas a microgeração e venda de energia por parte dos clientes (necessitando pelo menos de aparelhos de contagem que a façam nos dois sentidos e de registo independente dos totais, o que não era possível com os equipamentos presentes). Mas veja-se a posição do regulador:
3.2.4 FUNCIONALIDADES ASSOCIADAS À MICRO-GERAÇÃO

A medição da energia activa nos dois sentidos e a medição de energia reactiva nos quatro quadrantes constitui uma funcionalidade básica dos novos contadores.

Todavia, considera-se importante assinalar que a introdução da micro-geração acarreta outro tipo de necessidades designadamente no que se refere à operação da rede em condições técnicas e de segurança adequadas.

Instalações com micro-geração podem igualmente implicar necessidades adicionais de disponibilização de informação de modo a assegurar a optimização da gestão do consumo na instalação.

O facto de ainda não existir uma ideia clara das necessidades deste tipo de instalações e considerando que o número de instalações com micro-geração corresponderá a uma percentagem relativamente baixa da totalidade das instalações, não se considera adequado incluir nas funcionalidades mínimas dos contadores outras funcionalidades para além da capacidade de medição nos termos anteriormente referidos.
Conclusão: mais um momento de "voluntarismo" à custa dos consumidores.

19 comentários:

Anónimo disse...

Bom post, análise oportuna, boa crítica.

Luís Lavoura

Anónimo disse...

Os benefícios associados à poupança de energia - e, sobretudo, de potência - não são, ao contrário daquilo que o regulador diz, bemefícios para os consumidores. São, sim, benefícios para os produtores e distribuidores da energia. Por exemplo, eu não tenho benefício nenhum em lavar a roupa durante a noite em vez de o fazer durante o dia; quem beneficia em que eu faça isso é o produtor da energia, que desta forma não precisa de produzir tanta potência à hora de ponta (de dia) e desloca essa potência para a noite. Logo, o interesse nos cntadores bi-horários e, mais geralmente, nos novos contadores, não é para o consumidor, é para o produtor. Com estes novos contadores, os produtores de energia poderão modificar livremente as tarifas da eletricidade ao longo do dia, dessa forma estimulando os consumidores a gastar menos energia nas horas de ponta, o que beneficiará os produtores de energia - não os consumidores.

Do meu ponto de vista de consumidor, interessa-me, por exemplo, chegar a casa logo à noite e ligar simultaneamente no máximo todos os aquecedores elétricos da casa. Não o faço apenas porque sei que isso rebentaria com a potência instalada. Quem tem interesse em que eu não faça não sou eu, é a EDP.

Eu acho ótimo que se instalem estes novos contadores, que permitirão uma micro-gestão cuidadosa do sistema elétrico, obstando a consumos excessivos nas horas de ponta. Acho isso muito bem. Mas quem deve pagar os contadores é quem beneficia deles - as empresas produtoras e distribuidoras, que terão menos problemas em gerir as suas máquinas e as suas redes em horas de ponta.

Luís Lavoura

Anónimo disse...

Veio hoje a lume a notícia de que está em consideração a mudança dos contadores de energia, e que para o efeito a ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos) apresentou uma proposta ao governo. De seguida analisa-se o seu conteúdo nos pontos essenciais e, quanto a mim, demonstra-se que mais uma vez o regulador se demite de uma perspectiva de isenção entre todos os intervenientes no mercado e que, mais, se demite de restringir o âmbito da sua intervenção a questões regulatórias e opta por avançar por questões que deveriam ser decisões da esfera dos intervenientes.

Em termos resumidos, é apresentado na proposta o seguinte quadro-resumo dos custos e benefícios da medida, que versa essencialmente introduzir a possibilidade de telecontagem/telegestão das instalações de consumo:



Focando na coluna dos benefícios, verifica-se que a generalidade destes vai na direcção dos distribuidores de energia, sendo que os benefícios para os consumidores se centram nas duas últimas linhas, nomeadamente "redução de consumos" e "alteração de hábitos de consumo". Ora já aqui se verifica o enviesamento da análise: a que propósito é que um regulador, de uma determinada área de mercado, sai das suas competências naturais de regulação do bom funcionamento desse mercado, para se alargar em considerações relativas aos moldes técnico-comerciais e às quantidades do bem que é transaccionado?

Alguém concebe um regulador de venda de laranjas a ditar considerações sobre se devem ser vendidas mais ou menos laranjas, de manhã ou à tarde? Acresce ao enviesamento o facto de se contraporem aos benefícios palpáveis e quantificáveis do lado dos distribuidores meras expectativas (não muito distintas de wishful thinking) de "mudanças de comportamento de consumo" que poderão originar no consumidor, expectativas estas genericamente pouco fundadas e mais do que atacáveis. Principalmente quando já é possível com a tecnologia de contadores existente ao consumidor acompanhar o seu consumo ou beneficiar de tarifas bi-horárias. O próprio regulador reconhece em parte o facto:

VALORIZAÇÃO DOS BENEFÍCIOS ASSOCIADOS À PROMOÇÃO DA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA

É consensual a dificuldade em quantificar a redução de consumos que pode ser atribuída à instalação dos novos contadores de energia, quer devido à natureza indirecta da relação entre o nível de informação dos consumidores e as suas decisões de consumo, quer sobretudo devido à falta de evidências experimentais aplicadas à realidade portuguesa neste domínio.

Todavia, é igualmente consensual que este benefício é um dos principais aspectos positivos dos sistemas de contagem mais sofisticados, primeiro enquanto canais de sensibilização dos consumidores quanto aos seus consumos e ao preço da energia, segundo enquanto facilitadores do desenvolvimento do mercado de equipamentos e serviços de eficiência energética.
Ou seja, anuncia-se como principal (e, diga-se, única) vantagem para os consumidores uma vantagem que se assume logo em seguida como sendo essencialmente imprevisível e não sustentada por qualquer evidência com o mínimo de critério científico. Ou seja, "espera-se" e "acha-se" que vai tudo correr bem, mas entretanto vão-se avançando com valores. Ora, colocando valores nos itens:



Vejam-se agora as conclusões:



Ou seja, são apresentados no seguimento das considerações anteriores, dois cenários: um "pessimista", que ignora os supostos benefícios do lado do consumidor, e em que são apresentados resultados catastróficos em termos de custos; um anunciado (por sua iniciativa) como "optimista", em que é apresentado um balanço positivo de 18 milhões de euros. Ou seja, 2,5% dos custos.

Qual é a decisão? Naturalmente avançar. Só que há um "pequeno" problema: é que esses custos vão ser essencialmente imputados ao consumidor, por via da tarifa imposta administrativamente. Ou seja, o risco corre por conta do freguês.

O regulador optou por promover a custo de funcionamento do mercado uma factura que deveria ser deixada como decisão técnico-comercial dos distribuidores, que repercutiriam como entendessem na sua operação esse custo.

Não há nenhuma razão técnica que suscite dúvidas, no presente, da funcionalidade e adequação dos contadores disponíveis em cumprir para com os contratos de fornecimento existentes. Não cumpre portanto a um regulador ser o percursor, ainda mais com distribuição muito criticável da factura, de "inovações" e "serviços", ou ser o técnico de marketing ou de operações dos distribuidores.

Aliás, mesmo de um ponto de vista técnico, fica patente a precipitação e são de questionar as decisões numa decisão com custos desta monta e com um horizonte de vigência anunciado como sendo de 20 anos: poder-se-ia dizer que um dos benefícios da troca de contadores poderia ser a adaptação destes ao novo enquadramento regulatório, que veio permitir entre outras coisas a microgeração e venda de energia por parte dos clientes (necessitando pelo menos de aparelhos de contagem que a façam nos dois sentidos e de registo independente dos totais, o que não era possível com os equipamentos presentes). Mas veja-se a posição do regulador:
3.2.4 FUNCIONALIDADES ASSOCIADAS À MICRO-GERAÇÃO

A medição da energia activa nos dois sentidos e a medição de energia reactiva nos quatro quadrantes constitui uma funcionalidade básica dos novos contadores.

Todavia, considera-se importante assinalar que a introdução da micro-geração acarreta outro tipo de necessidades designadamente no que se refere à operação da rede em condições técnicas e de segurança adequadas.

Instalações com micro-geração podem igualmente implicar necessidades adicionais de disponibilização de informação de modo a assegurar a optimização da gestão do consumo na instalação.

O facto de ainda não existir uma ideia clara das necessidades deste tipo de instalações e considerando que o número de instalações com micro-geração corresponderá a uma percentagem relativamente baixa da totalidade das instalações, não se considera adequado incluir nas funcionalidades mínimas dos contadores outras funcionalidades para além da capacidade de medição nos termos anteriormente referidos.
Conclusão: mais um momento de "voluntarismo" à custa dos consumidores.

Posted by JLP at 18:04

Labels: energia, reguladores


2 comments:
Anonymous said...
Bom post, análise oportuna, boa crítica.

Luís Lavoura

"Os benefícios associados à poupança de energia - e, sobretudo, de potência - não são, ao contrário daquilo que o regulador diz, bemefícios para os consumidores."

Não sei o que é a "poupança de potência" mas poder mudar a potência contratada de acordo com as necessidades reais de cada consumidor sem precisar de alterar o contador ou de estar em casa parece-me um benefício para o consumidor.

"Por exemplo, eu não tenho benefício nenhum em lavar a roupa durante a noite em vez de o fazer durante o dia"

Se tiver um contador bi-horário (ou os futuros telecontadores, com até seis tarifas diárias) tem todo o interesse em lavar a roupa à noite pois, para a mesma quantidade de energia, irá pagar menos, independentemente se esta é mais ou menos barata ou fácil de produzir ou se facilita o despacho do gestor da rede. Do ponto de vista do consumidor há sempre um benefício.


"Com estes novos contadores, os produtores de energia poderão modificar livremente as tarifas da eletricidade ao longo do dia, dessa forma estimulando os consumidores a gastar menos energia nas horas de ponta, o que beneficiará os produtores de energia - não os consumidores."

Discordo. Na minha opinião ao optimizar o meu consumo, por ter consciência de quanto custa, gasto menos energia e consumo a horas em que esta é mais barata logo vou pagar menos por mês. O consumidor é beneficiado.


"Do meu ponto de vista de consumidor, interessa-me, por exemplo, chegar a casa logo à noite e ligar simultaneamente no máximo todos os aquecedores elétricos da casa. Não o faço apenas porque sei que isso rebentaria com a potência instalada. Quem tem interesse em que eu não faça não sou eu, é a EDP."

Pode sempre pedir um aumento de potência instalada. Tenho a impressão que, considerando o aumento na factura devido à maior potência, quem tem interesse nisso é... a EDP.

Jaime Vogado

Anónimo disse...

Peço desculpa aos leitores e ao JLP por me ter esquecido de retirar o texto original. Cumprimentos.

Jaime Vogado

JLP disse...

LL,

"Os benefícios associados à poupança de energia - e, sobretudo, de potência - não são, ao contrário daquilo que o regulador diz, bemefícios para os consumidores. São, sim, benefícios para os produtores e distribuidores da energia."

Na prática, tem razão, no que toca ao item relativo à deslocação temporal do consumo (o outro é diferente, porque acarreta teoricamente menos energia vendida). Mas a ideia é vendida como sendo um benefício para o consumidor pelo facto de assumir a existência de pacotes de tarifa bi-horária, e tirar a conclusão que a melhor monitorização do consumo empurraria o consumo para o vazio, resultando numa diminuição da factura a pagar. Claro que omite que essa factura só desce porque interessa aos produtores em termos da gestão do seu parque produtivo.

Mas eu já nem queria fazer uma grande análise subjectiva dos itens apresentados. A ideia era que, mesmo focando nos argumentos objectivos apresentados, a proposta não tem ponta por onde se lhe pegue.

"Não o faço apenas porque sei que isso rebentaria com a potência instalada. Quem tem interesse em que eu não faça não sou eu, é a EDP."

Sim, mas aí reconheço que há algum problema regulatório, já que essa mudança de paradigma (de potência contratada), revoluciona até toda a metodologia de planeamento e concepção de todo o sistema eléctrico.

"Eu acho ótimo que se instalem estes novos contadores, que permitirão uma micro-gestão cuidadosa do sistema elétrico, obstando a consumos excessivos nas horas de ponta."

A questão é que a telegestão nem sequer é um mínimo imposto pelo regulador. A proposta base de mínimo é de telecontagem unidireccional.

JLP disse...

Caro Jaime Vogado,

"Não sei o que é a "poupança de potência" mas poder mudar a potência contratada de acordo com as necessidades reais de cada consumidor sem precisar de alterar o contador ou de estar em casa parece-me um benefício para o consumidor."

Como referi acima, a telegestão não faz parte do mínimo a implementar. Esse mínimo é somente de telecontagem unidireccional.

"Se tiver um contador bi-horário (ou os futuros telecontadores, com até seis tarifas diárias) tem todo o interesse em lavar a roupa à noite pois, para a mesma quantidade de energia, irá pagar menos, independentemente se esta é mais ou menos barata ou fácil de produzir ou se facilita o despacho do gestor da rede. Do ponto de vista do consumidor há sempre um benefício."

A questão é que esse benefício é absolutamente fictício. Não há nada que actualmente o impeça de já beneficiar dele nem é introduzida nenhuma mudança de facto (não há nenhuma questão técnica nem de tarifário que seja alterada). Somente é apresentado o facto de que esse benefício se pode tornar mais "visível".

Anónimo disse...

JLP,

Se voltar a ler a proposta da ERSE verá que o que se propõe é o cenário AMM, isto é, telecontagem bidireccional, porque se conclui que é o que dará mais benefícios tendo em conta os pressupostos possíveis.
O cenário unidireccional é mencionado apenas para comparação. A proposta base de mínimo da ERSE é de telecontagem bidireccional.

"Na prática, tem razão, no que toca ao item relativo à deslocação temporal do consumo (o outro é diferente, porque acarreta teoricamente menos energia vendida). Mas a ideia é vendida como sendo um benefício para o consumidor pelo facto de assumir a existência de pacotes de tarifa bi-horária, e tirar a conclusão que a melhor monitorização do consumo empurraria o consumo para o vazio, resultando numa diminuição da factura a pagar."

E não é assim? A factura não diminui se consumir em períodos de tarifas reduzida?

"Claro que omite que essa factura só desce porque interessa aos produtores em termos da gestão do seu parque produtivo."

E? Não compreendo: O consumidor só paga menos porque isso interessa ao produtor. E? Isso é mau? Deveria ser com "boa" intenção e não com "má" intenção?


Cumprimentos,

Jaime Vogado

Anónimo disse...

"Como referi acima, a telegestão não faz parte do mínimo a implementar. Esse mínimo é somente de telecontagem unidireccional."

Como já lhe respondi, o mínimo proposto pela ERSE é a telecontagem bidireccional com tecnologia AMM e não a telecontagem unidireccional, por várias razões expostas no documento e visto ter sido essa a solução de consenso na consulta pública. Esta foi apresentada no documento de consulta pública, assim como a bidireccional e a bidireccional com medição de outros serviços, de forma a enquadrar as possíveis soluções. Em nenhum ponto do documento da ERSE é afirmado que a a proposta é a telecontagem unidireccional.

"Não há nada que actualmente o impeça de já beneficiar dele nem é introduzida nenhuma mudança de facto (não há nenhuma questão técnica nem de tarifário que seja alterada)."

Completamente em desacordo.
Técnica: Com telecontagem pode mudar de comercializador por telefone ou internet sem precisar de abrir a porta a um técnico para lhe alterar o contador, como tem de fazer hoje, e assim mudar de tarifário.
Tarifário: Poderá ter pelo menos 6 períodos tarifários, semanais, diários, mistos, conforme a oferta de mercado que lhe seja mais conveniente naquela semana (actualmente só tem dois e tem de pedir um contador novo, bi-horário e estar em casa para o receber), e mudar conforme lhe convier: se um outro comercializador tiver uma melhor proposta bastará telefonar-lhe.

Jaime Vogado

JLP disse...

"O cenário unidireccional é mencionado apenas para comparação. A proposta base de mínimo da ERSE é de telecontagem bidireccional."

Tem razão.

Mas questiono a expectativa de, somente com a introdução de telegestão, melhorar para o dobro a "eficiência energética".

Além disso, no seu comentário original, esqueci-me de apontar que geralmente a mudança de potência instalada, no presente, não obrigar à mudança de contador. Tal é somente necessário se for para mudar entre mono e trifásico e/ou entre tarifa normal e bi-horária. Naturalmente, a alteração (da parametrização do disjuntor, não de contador) tem que ser feita presencialmente.

"E não é assim? A factura não diminui se consumir em períodos de tarifas reduzida?"

E isso já não é possível, exactamente nos mesmos moldes, no presente?

"E? Não compreendo: O consumidor só paga menos porque isso interessa ao produtor. E? Isso é mau? Deveria ser com "boa" intenção e não com "má" intenção?"

A questão é que há nenhuma novidade nesse campo.

Além de que, contrariamente ao que é apresentado (ou pelo menos não é clarificado nesse sentido), tal não é um benefício exclusivo dos clientes (contrariamente à generalidade dos benefícios, esses sim exclusivos, dos produtores). É, quando muito, o resultado de um encontro de interesses entre ambos, que em grande parte deveria dispensar sequer a intervenção (principalmente a iniciativa) do regulador.

JLP disse...

"Técnica: Com telecontagem pode mudar de comercializador por telefone ou internet sem precisar de abrir a porta a um técnico para lhe alterar o contador, como tem de fazer hoje, e assim mudar de tarifário."

Não vejo que alteração de contador será necessária pela simples mudança de comercializador. Ou nenhuma acção adicional a um registo da contagem, que pode ser feita sem a presença do consumidor em casa.

"Tarifário: Poderá ter pelo menos 6 períodos tarifários, semanais, diários, mistos, conforme a oferta de mercado que lhe seja mais conveniente naquela semana (actualmente só tem dois e tem de pedir um contador novo, bi-horário e estar em casa para o receber), e mudar conforme lhe convier: se um outro comercializador tiver uma melhor proposta bastará telefonar-lhe."

A questão é que está a misturar duas coisas: a definição de novos períodos tarifários (essa sim porventura uma competência do regulador), com a obrigatoriedade de instalar equipamentos que suportem esses novos contratos (a expensas do consumidor), mesmo que este não esteja minimamente interessado (ou que até nem lhe seja economicamente interessante) e que esteja perfeitamente satisfeito com a situação presente.

JLP disse...

Aliás, em relação ao último ponto, relembro-lhe o que aconteceu quando foram introduzidas as tarifas bi-horárias: somente os clientes que quiseram delas dispor é que tiveram que mudar de contador...

Anónimo disse...

"Não vejo que alteração de contador será necessária pela simples mudança de comercializador."

Tem razão: para a simples mudança de um comercializador com tarifa plana para outro com tarifa plana isso é verdade. Mas apenas nesse caso e isso não ajudará muito o mercado da electricidade a desenvolver-se. É mais fácil um comercializador oferecer tarifas diferentes durante o dia do que baixar o preço de uma tarifa plana. Suponha que quer mudar para um comercializador que tem três tarifas diárias. Como fará?

"Ou nenhuma acção adicional a um registo da contagem, que pode ser feita sem a presença do consumidor em casa."

O meu contador de electricidade está dentro de casa. Como pode ser feita a contagem se eu não estiver em casa? Eu sei que posso comunicar a leitura por telefone mas, se ler o regulamento de qualidade de serviço do sector eléctrico verá que é sempre preciso, a determinada altura, haver uma leitura presencial feita por um elemento do distribuidor. Essa leitura tem custos. Presumo que saiba quem os paga actualmente.

Jaime Vogado

Anónimo disse...

"A questão é que está a misturar duas coisas: a definição de novos períodos tarifários (essa sim porventura uma competência do regulador), com a obrigatoriedade de instalar equipamentos que suportem esses novos contratos (a expensas do consumidor), mesmo que este não esteja minimamente interessado (ou que até nem lhe seja economicamente interessante) e que esteja perfeitamente satisfeito com a situação presente."

Não defendi, nem a ERSE o fez, que devam ser os consumidores a pagar os novos contadores. A ERSE foi mandatada para entregar uma proposta de funcionalidades mínimas e um plano de implementação de telecontagem, de acordo com o que foi decidido pelo governo. Cabe ao governo decidir se quer impôr telecontagem, se quer que sejam os consumidores ou as empresas a pagar e quando o quer fazer. Está o JLP a confundir duas coisas: as competências do regulador ERSE e as competências do ministério da Economia.

Por outro lado relembro-lhe que todos os contadores têm um tempo de vida útil de vinte anos e que ao fim desse tempo devem ser substituidos mesmo que o consumidor o queira manter. Será que a existência de obrigações metrológicas que garantem a qualidade da medição também é um abuso da liberdade de escolha do consumidor?

Anónimo disse...

Esqueci-me de assinar: Jaime Vogado.

Desejo-lhe um bom fim de semana e a continuação de um debate interessante.

JLP disse...

"Mas apenas nesse caso e isso não ajudará muito o mercado da electricidade a desenvolver-se. É mais fácil um comercializador oferecer tarifas diferentes durante o dia do que baixar o preço de uma tarifa plana. Suponha que quer mudar para um comercializador que tem três tarifas diárias. Como fará?"

A função de um regulador não é pugnar pelo desenvolvimento do mercado. A sua função é sim a de estabelecer com clareza as regras desse mercado, e adequar estas às inovações que vão surgindo, por solicitação dos intervenientes nesse mercado.

A questão que coloca deve ser resolvida pelo comercializador e pelo potencial cliente. São estes que se têm que entender em relação às condições técnicas e comerciais em que o serviço vá ou não ser prestado. Ao abrigo das competências que se esperam da ERSE, esta só se deveria pronunciar sobre se esses contratos são válidos ou não, e eventualmente standardizá-los. E impor, por exemplo, regulações metrológicas e técnicas aos equipamentos envolvidos.

Agora não se pode é estar a obrigar a uma mudança compulsória consumidores que estão plenamente satisfeitos com o seu serviço presente, e que não se enquadram sequer nos beneficiários das previsíveis mudanças. Basicamente, subsidiar através de uma economia de escala um determinado segmento do mercado que poderia equacionar essa mudança.

"O meu contador de electricidade está dentro de casa. Como pode ser feita a contagem se eu não estiver em casa?"

Essa situação é uma situação legada, e ao que sei já não é aceite em novas instalações de utilização de energia eléctrico. Compreendo perfeitamente que o titular que se encontre nessa situação tenha que enfrentar o custo pessoal de estar presente para se efectuar mudanças ou leituras, mudanças que são da sua iniciativa ou leituras que se inserem nas suas obrigações contratuais.

"Essa leitura tem custos. Presumo que saiba quem os paga actualmente."

Naturalmente que é o consumidor. Mas então eu coloco-lhe a questão ao contrário: porque é que o regulador não considerou repercutir na tarifa os ganhos subjacentes às economias, por exemplo, que se obtêm pela eliminação dessas equipas no terreno com a introdução da telecontagem/telegestão?

O que acontece, espantosamente, é que se foi no outro sentido: manteve-se a tarifa e as taxas que existiam, e acrescentou-se mais uma parcela.

"Não defendi, nem a ERSE o fez, que devam ser os consumidores a pagar os novos contadores."

Tomando a ERSE a iniciativa de achar legítimo (e propor nesse sentido) que a intervenção se repercuta na tarifa, que é imposta administrativamente, não me parece que se possa tomar essa conclusão...

"Está o JLP a confundir duas coisas: as competências do regulador ERSE e as competências do ministério da Economia."

O que acho é que o comportamento da ERSE propencia a esse género de confusões...

"Por outro lado relembro-lhe que todos os contadores têm um tempo de vida útil de vinte anos e que ao fim desse tempo devem ser substituidos mesmo que o consumidor o queira manter."

Então porque é que não se impõe que a mudança seja feita no final dessa vida útil, ao invés de se ir avançar para um fim de vida prematuro de milhões de equipamentos? Da proposta (pág. 28):

"Os contadores com uma antiguidade inferior a 7 anos representavam 83% do total do imobilizado líquido a 31 de Dezembro de 2006, e cerca de dois terços da amortização do exercício de 2006. O equipamento com uma antiguidade inferior a 5 anos correspondia a cerca de dois terços do total do imobilizado líquido referido anteriormente, e as correspondentes amortizações anuais deste equipamento representavam cerca de 45% do total das amortizações anuais dos contadores em BTN."

"Será que a existência de obrigações metrológicas que garantem a qualidade da medição também é um abuso da liberdade de escolha do consumidor?"

Claro que não. A necessidade de um contador metrologicamente válido não está sequer em discussão, e é essencial para a fiscalização do comprimento do contrato.

"Desejo-lhe um bom fim de semana e a continuação de um debate interessante."

Bom fim de semana. É sempre bom poder reconhecer um colega por estas paragens. :-)

Anónimo disse...

Boa tarde,

"porque é que o regulador não considerou repercutir na tarifa os ganhos subjacentes às economias, por exemplo, que se obtêm pela eliminação dessas equipas no terreno com a introdução da telecontagem/telegestão? (...) O que acontece, espantosamente, é que se foi no outro sentido: manteve-se a tarifa e as taxas que existiam, e acrescentou-se mais uma parcela."

Se ler a proposta verá que os custos com a leitura local são retirados: pág. 2 'Os benefícios estimados incluem os custos evitados de leitura e parametrização local dos contadores'

"A função de um regulador não é pugnar pelo desenvolvimento do mercado."

Estatutos da ERSE, Artigo 3.º, n.º 1: 'São atribuições gerais da ERSE: (...)b) Implementar a liberalização do sector eléctrico, preparar a liberalização do sector do gás
natural e fomentar a concorrência de modo a melhorar a eficiência das actividades sujeitas à
sua regulação'.

"Então porque é que não se impõe que a mudança seja feita no final dessa vida útil, ao invés de se ir avançar para um fim de vida prematuro de milhões de equipamentos?"

Óptima questão. Coloque-a a quem definiu 10 anos como o tempo de amortização dos contadores para efeitos contabilísticos, não ao regulador.

Melhores cumprimentos,

Jaime Vogado

JLP disse...

"Se ler a proposta verá que os custos com a leitura local são retirados: pág. 2 'Os benefícios estimados incluem os custos evitados de leitura e parametrização local dos contadores'"

Não digo que não. O que acho curioso é que a remoção desses custos, que ninguém nega serem significativos, acaba por se diluir na conclusão final de se aumentar a tarifa. Das duas uma: ou o seu peso afinal não é relevante (o que é contrariado pela realidade com que aparentemente concordamos), ou há novos custos que estão a ser sobredimensionados.

"Estatutos da ERSE, Artigo 3.º, n.º 1: 'São atribuições gerais da ERSE: (...)b) Implementar a liberalização do sector eléctrico, preparar a liberalização do sector do gás
natural e fomentar a concorrência de modo a melhorar a eficiência das actividades sujeitas à
sua regulação'."

Não leio aí nada que diga que o mandato da ERSE é o de definir os caminhos que vão ser trilhados por esse mercado livre. É que um mercado livre, por definição, deveria ser um mercado com menos regras e com menos imposições verticais. O que se verifica que não acontece, já que aparentemente a "liberdade" se "implementa" através de medidas verticais obrigatórias e globais.

Não vejo, como já referi, que haja algum impedimento sequer em se implementar um mercado livre com as condições actuais, ou esperando que seja dos intervenientes a partir a iniciativa de criar novas soluções de mercado.

Aliás, uma das constatações no mínimo curiosas na maneira como o regulador vê esse contributo para a "liberalização" ou "aumento da eficiência" do mercado é a sua posição em relação à microgeração...

"Óptima questão. Coloque-a a quem definiu 10 anos como o tempo de amortização dos contadores para efeitos contabilísticos, não ao regulador."

Uma coisa é a amortização contabilística, que deveria ser um problema entre os comercializadores e o regulador. Outra coisa é a validade metrológica dos equipamentos.

O fscto de um equipamento se amortizar em 10 anos não quer dizer que este se torne inválido a partir desse momento.

Cumprimentos.

Anónimo disse...

Bom dia,

"Uma coisa é a amortização contabilística, que deveria ser um problema entre os comercializadores e o regulador. Outra coisa é a validade metrológica dos equipamentos."

É óbvio.
Por isso mesmo escrevi "amortização contabilística" e não "validade metrológica".
Não percebo como pode este ser um problema entre os comercializadores e o regulador se não é este que define o período de amortização (o que aliás foi o que escrevi e era o ponto que queria frisar e ao qual não respondeu), nem os contadores são propriedade dos comercializadores mas do operador da rede de distribuição.


"O fscto de um equipamento se amortizar em 10 anos não quer dizer que este se torne inválido a partir desse momento."

É óbvio.
Repito: não é o regulador que define o período de amortização contabilística dos equipamentos.

"'Se ler a proposta verá que os custos com a leitura local são retirados(...)'Não digo que não."

Desculpe mas diz. No seu comentário anterior: 'manteve-se a tarifa e as taxas que existiam, e acrescentou-se mais uma parcela.'

"Das duas uma: ou o seu peso afinal não é relevante (o que é contrariado pela realidade com que aparentemente concordamos), ou há novos custos que estão a ser sobredimensionados"
Porquê sobredimensionados?

"Aliás, uma das constatações no mínimo curiosas na maneira como o regulador vê esse contributo para a "liberalização" ou "aumento da eficiência" do mercado é a sua posição em relação à microgeração..."

Qual é que acha que é a posição do regulador em relação à microgeração? Em que documentos se baseia? Que poderes acha que o regulador tem actualmente em relação à definição do que quer que seja sobre a microgeração, uma vez que não regula a produção? Que poderes acha que deveria ter? Acha que num mercado que se pretende liberalizado o regulador deveria também regular a produção?

Sinceros cumprimentos,

Jaime Vogado

JLP disse...

"Não percebo como pode este ser um problema entre os comercializadores e o regulador se não é este que define o período de amortização (o que aliás foi o que escrevi e era o ponto que queria frisar e ao qual não respondeu), nem os contadores são propriedade dos comercializadores mas do operador da rede de distribuição."

Tem razão que o problema diz respeito ao ORD, os proprietários do equipamento, e não aos comercializadores. O que eu pretendia dizer é que a repercursão na tarifa da amortização desses contadores, e como tal a validade do prazo de amortização, teve que ser homologado e negociado com a ERSE, não?

"Porquê sobredimensionados?"

Porque se os benefícios são tão grandes como se apresenta, em termos de mão-de-obra e de equipas no terreno, e mesmo assim é preciso pagar uma factura, é porque se calhar não se está a ser claro com os custos que essa mudança acarreta, e a quem é passado em última instância esse benefício e essa factura.

"Acha que num mercado que se pretende liberalizado o regulador deveria também regular a produção?"

Eu não me referi em nenhum lado nenhuma intervenção do regulador na regulação da microgeração. O que fiz (e mantenho) foi manifestar a minha estranheza pelo desprezo a que o regulador vota a questão da microgeração, uma realidade emergente do mercado, numa intervenção desta monta e com o impacto que tem.

Além de que concretamente, o que se está a discutir é uma questão acessória à regulação propriamente dita da actividade de cogeração, no caso a adaptação do equipamento de contagem a essa realidade, e não se está a falar em regular a actividade de microgeração em concreto.

Afinal, quando refere acima os estatutos da ERSE no sentido de "fomentar a concorrência de modo a melhorar a eficiência das actividades sujeitas à
sua regulação" não é disso que se trata?