Bolinha vermelha
Pegando na extensa discussão, cá no blog, sobre o critério da moralidade e da subjectividade nas escolhas e decisões do estado, dos legisladores e dos tribunais, surge uma curiosa aplicação à situação da professora que morreu de leucemia.
A teoria e a norma diriam que não há nada de chocante no facto de a C.G. Aposentações tentar impedir a atribuição da reforma. Cumpre-lhe verificar a aplicabilidade da mesma, e tomar uma série de decisões (embora, neste caso, me pareçam erradas). E cumpre aos tribunais dirimir eventuais discordâncias.
Depois há o mundo real. Onde todos os agentes têm a noção que os processos judiciais se arrastam. Onde os técnicos da CGA têm a noção do poder discriminatório que têm. Têm a noção das batotas que se foram fazendo ao longo dos tempos. Das pensões "milionárias" construídas no tempo em que contavam os últimos 5 anos. Dos sub-sistemas que se multiplicaram ao sabor dos lobbies que os conseguiram impôr.
É isso mesmo. A moralidade. Coisa difícil. Neste caso, vergonhosamente ausente. Para quem descontou pela tabela durante 30 anos. E tinha 60 de idade. E um cancro dos mais debilitantes.
Regras são regras. Mas às vezes, **** que as *****.
8 comentários:
1) A situação é muito triste. A CGA só pode ter errado muitíssimo na avaliação que fez, posto que já parte provavelmente do pressuposto que os atestados médicos valem zero. E a quem atribuir a culpa do valor nulo desses documentos? Pois...é caso para dizer que paga o justo pelo pecador.
2) Seria muito difícil resolver a questão num tribunal em tempo útil. Só através de uma providência cautelar e mesmo essas demoram 1 ou 2 meses. Não sei se iria a tempo; a senhora parece que só tentou o recurso administrativo, não lhe tendo sido dada razão.
3) A questão dá um excelente caso prático. Como deviam ser as leis de trabalho? Enquanto a reforma não fosse dada, devia ser possível despedir um trabalhador doente (com leucemia), em razão do facto de, em virtude da doença, já não ser produtivo? Se se responder "sim", a questão levantar-se-ia também. Isto porque, ao que parece, a senhora foi dar aulas, porque não podia perder o vencimento. Claro que um empregador pode sempre passar a batata quente para a CGA, dizendo que não tem de arcar com os problemas da senhora, sendo essa uma tarefa da CGA; pelo que pode despedir o trabalhador que falte em razão de doença. Ainda assim, também quanto ao empregador surgem questões de "moralidade": despedir uma pessoa doente que precisa do dinheiro antes de obter a reforma não é propriamente bonito. Para que não fosse despedida,a senhora teria de ir para o trabalho à viva força nem que para isso tivesse de passar pelo que, infelizmente, passou nesta situação. A solução é ter um seguro que cubra situações destas, mas quem é que tem?
Note-se: isto acontece num Estado dito Social, o que é trágico para quem acredite no socialismo, o que não é o meu caso. Mas o mesmo podia acontecer num qualquer outro regime. E é por isso que tem de haver alguma flexibilidade na ideologia, porque a realidade é muito mais imaginativa.
Afinal este pessoal é mais mole do que se pensava!
Era isso que eu pretendia salientar Zé. Trinta e quatro anos de estado socialista (de rosto humano, dizem eles) conduziu a isto. Desrespeito total pelos casos singulares, desresponsabilização total do estado, desumanidade total para quem realmente precisa de apoio.
Mas isto com mais dinheiro e mais redistribuição vai lá.
Anónimo, isto é tudo malta nova.
Duros não faltam.
"Mas isto com mais dinheiro e mais redistribuição vai lá."
Tambem foi isso que eu pensei logo.
Era isso que eu pretendia salientar Zé. Trinta e quatro anos de estado socialista (de rosto humano, dizem eles) conduziu a isto. Desrespeito total pelos casos singulares, desresponsabilização total do estado, desumanidade total para quem realmente precisa de apoio. - Cirilo
Acho que é uma questão independente de regimes políticos. Nada me garante que sendo o regime diferente a questão não se colocaria. Mas o exemplo é bom para contestar a superioridade moral do socialismo. Sem dúvida. Pessoalmente, acho que a responsabilidade tem de ser dividida entre a CGA que esteve evidentemente mal e quem abusa dos atestados médicos (pseudo-doentes e médicos que fazem favores). Enfim, a desresponsabilização tem uma tradição longa no nosso país, tradição essa que terá sido acentuada com o Estado Social. Espero que a filha obtenha em tribunal uma indemnização decente.
Admito que tenhas razão. Mas é uma questão cultural sublimada pela subsidiomania.
E independentemente do cumprimento das suas funções, o estado nunca pode presumir que o cidadão é mentiroso até prova em contrário.
E isto só pode ser um sinal de um estado monstruoso, que se leva demasiado a sério e que já se acha uma entidade própria.
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