2007/05/31

Re: Fiscalidade, uma proposta

JLP,

Discordo desta proposta pelo princípio (1) e pela exequibilidade prática (2) da mesma. Porquê?

1) Pelo princípio, porque o estado não defende apenas o direito de propriedade. Se assim fosse ok. Quem tem mais propriedade devia contribuir com mais. Existem muitas outras liberdades (negativas) que o estado deve acautelar, e essas, por princípio estão igualmente distribuídas entre os indivíduos. Este ponto de princípio podia ser conciliado com a tua posição com uma fórmula fiscal simples. Todos pagam X como base (pela defesa dos direitos negativos não económicos) e Y= proporcional à propriedade (defesa dos direitos de propriedade).

Isto independentemente de transferências do estado para os cidadãos, bem entendido.

2) Não exequível por duas grandes razões.

a) Pela valorização da propriedade, impraticável, um problema associado ao da inventariação, mas independente.

b) Pela associação propriedade/indivíduo que pode ser dissociável. A taxação da propriedade pode ser feita tendo como referência a propriedade em si, de forma independente da nacionalidade do proprietário ou não. O exemplo da primeira é o IMI e o da segunda é o imposto sobre fortunas Francês. Tu queres associar o valor da defesa da propriedade à contribuição fiscal. A única forma de o fazer sem que a concorrência fiscal funcionasse para matar esse esquema seria com uma tributação directa sobre a propriedade. Toda a propriedade tributada via proprietário seria facilmente desviada com a mudança de nacionalidade ou de residência para um país mais “simpático” para os proprietários. E aqui entramos em um ninho de vespas. Alguns activos são muito pouco móveis, como a terra, já outros, como identificas bem na tua proposta são completamente móveis. E isto leva a forma actual de tributação de propriedade na maior parte dos países ocidentais. Apenas bem imóveis são tributados directamente.

3 comentários:

JLP disse...

Ricardo,

1) Uma questão que fica em aberto (e que é a pedra base da minha proposta) é se a propriedade, apesar de não ser o único bem que é salvaguardado, não será correlacionado e não será um bom indicador do esforço de protecção exercido pelo estado.

Naturalmente, há certos custos do estado que acho justo serem refletidos numa parcela fixa, como por exemplo os custos associados à implementação de uma safety net, uma vez que esta se vira para debelar um risco que é derivado a um indivíduo pura e simplesmente existir, e não àquilo que possui.

2)

a) A questão é que, a partir do momento em que a garantia da responsabilidade civil relativa a uma propriedade fica dependente da sua declaração e do valor declarado, tens toda a motivação para que o seu proprietário declare a sua visão real do seu valor de mercado. No fundo, equivale ao facto de não ser do interesse de alguém que faz um seguro de um bem mentir em relação ao seu valor, mesmo que isto o obrigue a pagar mais pelo seguro.

Não é preciso haver avaliação nem inventariação. O ónus de o fazer recai sobre o proprietário.

b) Exactamente por isso é que eu digo que teriam que ser taxadas as transferencias internacionais. Não o referi, mas naturalmente assim como as de capitais, por maioria de razão, também as de bens imóveis.

Ricardo G. Francisco disse...

JLP,

1) Aqui falo da protecção de outros direitos como o da vida, da integridade física e afins. Todos têm iguais direios aqui, certo?

As transferência do estado para os cidadãos são outra conversa.

2) Não entendi este imposto como um prémio de seguro. Sim como uma contribuição para a protecção da propriedade incluída nesse estado. NEste sentido os proprietários têm todos os incentivos para a sub avaliação já que indepententemente da avaliação terão os seus bens protegidos. A prática de free riding seria altamente recompensadora (já o é).

b) Todas as transferÊncias internacionais tributadas...estás a ver o ninho de vespas?

JLP disse...

1) "Aqui falo da protecção de outros direitos como o da vida, da integridade física e afins. Todos têm iguais direios aqui, certo?"

O minha tese é até que ponto é que a propriedade (entendida como posse de bens) não será fortemente correlacionada com as agressões à vida e à integridade física, e como tal um bom indicador do risco e do esforço necessário para os proteger.

2)

a) A questão é que só os têm protegidos em termos criminais, se não os declararem e se não o declararem pelo valor correcto. Por exemplo, se alguém fosse roubado e o criminoso apanhado, seria criminalmente condenado, mas só seria obrigado civilmente a repor o bem ou o valor deste que tivesse sido previamente registado pelo autor. Portanto, não há tentação de subavaliação, uma vez que ao subavaliar (conscientemente) o bem, o seu proprietário o está a excluir da protecção pelo seu real valor.

b) Eu não disse que o sistema proposto era perfeito, e identifiquei essa falha. É óbvio que é desagradável, e uma falha significativa. Mas também tem a vantagem de ser um problema claramente identificável e isolado, e como tal o foco claro do esforço para que o sistema funcione.