2007/03/14

Proliferação nuclear

A Líbia anunciou hoje que os EUA vão ajudar o país a construir uma central nuclear, destinada à produção de energia eléctrica, ao abrigo de um acordo que será assinado em breve. A confirmar-se, o anúncio marca uma nova fase na aproximação de Trípoli ao Ocidente.

Público Última Hora.
O único estado signatário do Tratado para a Não-proliferação Nuclear até agora apanhado em sua violação, produtor de petróleo membro da OPEP e produtor assinalável de gás natural, e até há pouco incontestado estado-pária, acaba aparentemente de receber uma festa no pêlo do seu novo amigo americano para a promoção de um programa nuclear pacífico.

O Kadaffi é o mesmo Kadaffi.

Aparentemente, o que a uns poucos milhares de quilómetros serve de motivo de suspeita e sanção internacional, aqui é aplaudido e fomentado. Está tudo bem.

Depois queixam-se... É esta a moralidade internacional dos impolutos.

17 comentários:

Camisa disse...

Que eu saiba nenhum país tem razões para impedir outro de utilizar o nuclear para fins pacíficos como seja a produção de energia. O caso do Irão é ridículo pois argumenta que é para fins pacíficos mas mantém um discurso de ódio e apregoa a aniquilação de Israel por todos os meios...

JLP disse...

"Que eu saiba nenhum país tem razões para impedir outro de utilizar o nuclear para fins pacíficos como seja a produção de energia."

Como se acompanhar o que escrevo saberá, na minha opinião nenhum estado tem nada que se imiscuir com qualquer questão que se passe no interior das suas fronteiras.

O que não inviabiliza que quer a Libia quer o Irão, assim como os EUA, no exercício da sua vontade soberana, tenham optado por assinar um tratado em que se comprometiam a desarmar os seus arsenais, a contribuir para a não proliferação nuclear, e a restringir o uso do nuclear a questões civis.

Agora permita-me também duvidar das intenções anunciadas da Líbia, que é produtor e exportador de petróleo e gás natural, e da sua necessidade num programa nuclear, mesmo que supostamente civil.

Quanto ao Irão, nem até agora foi detectada qualquer violação pelo Irão das suas obrigações assumidas no âmbito do TNPN (ao contrário da Líbia), nem estes iniciaram algum acto de agressão contra qualquer outro país. Acrescento também que não vejo qualquer autoridade moral de países terceiros em sancionar qualquer programa nuclear militar iraniano posterior a um eventual abandono do Irão desse tratado. Afinal, não é o único que o possuirá, contando-se até entre estes o Israel a que se refere.

Mentat disse...

"Depois queixam-se... É esta a moralidade internacional dos impolutos."

JLP

Não seja assim!
Os EUA já fizeram essa mesma oferta ao Irão.
A propósito foi através do JLP que tive conhecimento dum tipo de Central Nuclear em "kit" que impede o utilizador de ter acesso à tecnologia de enriquecimento do urânio, ou de ter acesso aos "subproduto final".
.

Mentat disse...

"...nem estes iniciaram algum acto de agressão contra qualquer outro país. "

Fornecer armas e treino a milicias que atacam um governo legitimamente eleito dum país vizinho é o quê ?
.

JLP disse...

"Os EUA já fizeram essa mesma oferta ao Irão."

Que a recusaram. E o que não inviabiliza que estejam a subverter tanto o espírito do tratado como o conceito de soberania.

"Fornecer armas e treino a milicias que atacam um governo legitimamente eleito dum país vizinho é o quê ?"

Hum... Legitimamente eleito... vizinho... Não estou a ver... :-D

JLP disse...

"A propósito foi através do JLP que tive conhecimento dum tipo de Central Nuclear em "kit" que impede o utilizador de ter acesso à tecnologia de enriquecimento do urânio, ou de ter acesso aos "subproduto final"."

Aquilo a que se está a referir são mini-reactores, algo de muito diferente em termos de escala de uma central nuclear. Além de que o que fazia era tornar segura a exploração, mas não impedia que, se assim o desejasse, o utilizador não pudesse ter acesso aos subprodutos da reacção desmantelando o reactor.

Mentat disse...

"... mas não impedia que, se assim o desejasse, o utilizador não pudesse ter acesso aos subprodutos da reacção desmantelando o reactor..."

Se entendi o que li o reactor era selado (tipo pilha) não permitindo o seu manuseamento a quem não possuisse a tecnologia.

Mentat disse...

"Hum... Legitimamente eleito... vizinho... Não estou a ver... :-D"

JLP

Entre o Irão e... "esse tal país que não está a ver", qual acha que tem processos eleitorais e regimes mais legitimos ?
Já não digo do ponto de vista da "democracia burguesa ocidental" mas dum ponto de vista meramente humano ?
.

JLP disse...

"Se entendi o que li o reactor era selado (tipo pilha) não permitindo o seu manuseamento a quem não possuisse a tecnologia."

O facto de ser selado é tão só uma medida de segurança. Não impede que, havendo vontade (e capacidade para isso), o reactor não possa ser desmantelado. Serve a analogia das pilhas: uma pilha é selada na sua utilização normal (esqueçamos os vazamentos), que não impede que possa ser se houver vontade desmanchada para utilizar o carvão e o zinco para outras coisas.

JLP disse...

"Entre o Irão e... "esse tal país que não está a ver", qual acha que tem processos eleitorais e regimes mais legitimos ?"

Sinceramente, não faço ideia. O que já sei é que, enquanto no Irão o problema diz só respeito aos iranianos, e ninguém se está a ingerir no processo, no "outro país" há uma ocupação em curso e uma intromissão directa de outro país nas instâncias do estado.

Por mim, prefiro que um ou outro seja deixado ao critério dos seus habitantes, e não ao critério externo que eu lhes queira impôr.

Mentat disse...

"Por mim, prefiro que um ou outro seja deixado ao critério dos seus habitantes, e não ao critério externo que eu lhes queira impôr."


JLP

Você sabe que isso é um "wishful thinking", e que o mundo não funciona assim, não sabe ?
.

JLP disse...

É "wishful" na medida em que é o que gostaria que acontecesse, é verdade.

Como também é verdade que, infelizmente, as coisas não funcionem assim. Mas, sendo as coisas da maneira como são, depois não me venham passar atestados de superioridade e pureza moral ocidental, assim como pedirem que lamente as "vítimas inocentes" quando as consequências de se alimentar o modo actual de fazer as coisas lhes vêm bater à porta.

Willespie disse...

"O único estado signatário do Tratado para a Não-proliferação Nuclear até agora apanhado em sua violação(...)"

Someone forgot Israel.

"Por mim, prefiro que um ou outro seja deixado ao critério dos seus habitantes, e não ao critério externo que eu lhes queira impôr."

Partilho muito este sentimento. Longe de achar que "não é assim que o mundo funciona" afirmo que é esta a única via verdadeira para qualquer espécie de solvência duradoura, no médio oriente.

Entre Israel e Palestina (Irão e Síria), existe uma reciprocidade e recursividade de agressões e de queixas de parte a parte e um sem-fim de fios de injúria a desfiar, até que o novelo de desfaça.

Alguém tem de estar disposto a dar o primeiro passo. Se forem capazes de dizer qual é esse primeiro passo, (reconhecimento do estado de Israel ou o fim da ocupação dos territórios palestinianos) têm muito mais coragem do que eu alguma vez terei.

O máximo que pudemos fazer enquanto ocidentais desejando paz, é apoiar Israel enquanto estado ameaçado, apoiar um governo Palestiniano (Abbas) e esperar que as parte se entendem, enquanto fazemos os possíveis para minimizar a influência do Irão e a Síria no apoio ao terrorismo.

JLP disse...

"Someone forgot Israel."

Israel não é signatário do tratado.

"Entre Israel e Palestina (Irão e Síria), existe uma reciprocidade e recursividade de agressões e de queixas de parte a parte e um sem-fim de fios de injúria a desfiar, até que o novelo de desfaça."

A problema é que isso é uma questão diferente. Aí não estamos a falar em ingerência em problemas internos de estados, mas num problema que involve a relação entre estados, uma vez que há o reconhecimento (internacional) que há violações de soberania de parte a parte.

Não é bem isso que está em discussão.

De qualquer forma, a única solução que vislumbro (com dificuldade) para o problema israelo-árabe, que mesmo em termos de direito internacional é complexo, é haver um reconhecimento da Palestina de Israel, mesmo que restrito às suas fronteira históricas internacionalmente reconhecidas, e a um simultâneo abandono de Israel dos territórios que ocupa ilegitimamente.

Ou então a solução "à bruta": na eminência de uma escalada da violência, se calhar o problema só acaba quando Jerusalem for um deserto nuclear...

Willespie disse...

"Israel não é signatário do tratado."

My point exactly. Alguém se esqueceu de lhes pedir a assinatura.

Ou então a solução "à bruta": na eminência de uma escalada da violência, se calhar o problema só acaba quando Jerusalem for um deserto nuclear...

Os muçulmanos em Israel/Palestina e aos redores, veneram a terra santa quase tanto como a própria cidade de Mecca. Jerusalém nunca será alvo de uma bomba nuclear por parte dos movimentos pro-palestinianos. O problema de largar a bomba em Jerusalém é que é um acto 'self-defeating', porque destrói justamente o que os palestinianos querem tanto preservar.

JLP disse...

"My point exactly. Alguém se esqueceu de lhes pedir a assinatura."

Não, tão somente não quiseram assinar. É um direito que lhes assiste. Um tratado só compromete os seus signatários, e deve ser um acto voluntário, quer na adesão, quer na saída.

Aliás, Israel não é o único estado não signatário, e até já houve quem o abandonasse.

O que já será criticável será porventura o apoio que os EUA tem dado na área nuclear a estados não-signatários, em deterimento do tratamento a que tem votado aqueles que são seus parceiros neste, quando se auto-impôs perante estes a obrigações de desarmamento e de não proliferação. Ou seja, tem tratado melhor (por razões naturalmente do seu interesse mas que não deixam de ser criticáveis) aqueles que ficaram de fora do tratado, além de demonstrar um double standard em relação aos seus parceiros de compromisso.

"O problema de largar a bomba em Jerusalém é que é um acto 'self-defeating', porque destrói justamente o que os palestinianos querem tanto preservar."

Não negue à partida o efeito de duas religiões que glorificam o martírio, e a perspectiva do "já que não é nosso, também não é de ninguém" (principalmente de nenhum porco infiel).

Willespie disse...

A possibilidade do "já que não é nosso, também não é de ninguém", mesmo sendo defendido pelos governos sucessivos governos de Israel, não me ocorre nenhum perito sério sobre o médio oriente que não descarta a hipótese. Já li algures, opiniões dos próprios Iranianos, penso que terá sido o Rafsanjani, de que se bombardeassem Jerusalém, o mundo árabe revoltaria-se contra eles e que a própria ideia era fruto de uma misconception sobre o conflito Israel-Palestiniano.

É claro que nunca se sabe o poderá acontecer.