2007/02/06

Prós & Contras I

Curiosa a posição do Dr. Oliveira e Silva, obstetra a favor do "Sim", expressa no programa. Segundo ele, irá continuar a caber ao médico a última palavra no que toca a julgar as razões apresentadas pela mulher legítimas ou não, suficientes ou não, usando discretamente do seu direito de objecção de consciência para esse efeito.

Concerteza não acompanha as declarações do seu bastonário. É que este já veio a público anunciar que será impiedoso para com quem invoque essa objecção de consciência no serviço público, e posteriormente os faça no privado. Ou seja, subintende-se que esse não será um direito discricionário do médico, mas terá que ser uma opção (única) clarificada e concretizada a anteriori. Anuncia-se até a necessidade do preenchimento de uma declaração (e da manutenção de um registo) sobre qual é a opção de consciência do médico.

Sejamos claros. Decidindo-se no sentido do Sim, não poderá haver uma maneira coerente com a decisão do referendo de a mulher lhe ver negada a sua vontade. Por mais institutos de aconselhamento, por mais perguntas que lhe sejam feitas (se esta optar por responder), não haverá uma maneira legal de impedir que a sua escolha tenha plenas consequências.

7 comentários:

JB disse...

Sejamos claros. Decidindo-se no sentido do Sim, não poderá haver uma maneira coerente com a decisão do referendo de a mulher lhe ver negada a sua vontade. Por mais institutos de aconselhamento, por mais perguntas que lhe sejam feitas (se esta optar por responder), não haverá uma maneira legal de impedir que a sua escolha tenha plenas consequências. - JLP

Claro que há. E se, João, estiveste atento houve uma médica a trabalhar na Suiça que explicou como os abortos de portuguesas emigrantes na Suiça desceram drasticamente pelo facto de frequentarem consultas de aconselhamento. Como o problema das mulheres portuguesas era o desconhecimento de métodos contraceptivos fiáveis, o problema resolveu-se pela educação sexual e pela prevenção.

A questão é que o problema das mulheres emigrantes na Suiça só foi detectado, porque apareciam sistematicamente nas estatísticas dos abortos. Tal detecção só é possível no quadro em que o aborto é descriminalizado até ás 10 semanas, porque, de outro modo, os médicos não têm estatísticas fiáveis e não podem actuar preventivamente.

JLP disse...

"E se, João, estiveste atento houve uma médica a trabalhar na Suiça que explicou como os abortos de portuguesas emigrantes na Suiça desceram drasticamente pelo facto de frequentarem consultas de aconselhamento."

A situação da Suiça tem algumas diferenças que não encaixam. Além de o aborto não ser subsidiado (é um facto), o que por si só pode já constituir um grande dissuasor, principalmente quando apresentado a comparação entre o seu custo e o da contracepção a quem não pratica a última e não faz a mínima ideia, há uma informação que não foi prestada e que seria importante conhecer. Não sendo o aborto praticado na Suiça no estado, quem é que tem a tutela sobre essas comissões de acompanhamento? O estado? O próprio hospital privado?

Anónimo disse...

São serviços hospitalares que confrontados com estatísticas que demonstravam um número superior de abortos praticados por mulheres portuguesas, fizeram uma investigação com inquéritos e concluíram que tal se devia ao facto de as mulheres portuguesas não usarem contraceptivos ou usarem-nos irregularmente. Identificado o problema, presumo que o Estado Suiço tenha financiado as sessões de esclarecimento levadas a cabo por essas equipas médicas e verificou-se uma diminuição para metade do número de abortos de mulheres portuguesas emigrantes num espaço de relativamente poucos anos.

Não teria sido possível identificar o problema se o aborto não estivesse despenalizado, porque não haveria estatísticas fiáveis que permitissem identificar o problema.

Anónimo disse...

"não poderá haver uma maneira coerente com a decisão do referendo de a mulher lhe ver negada a sua vontade"

Isto é falso. A vontade da mulher pode ser negada por ela não ter disponível em tempo útil e/ou por não ter dinheiro para pagar quem le faça o aborto.

Por exemplo, poderia dar-se o caso de o aborto ser despenalizado mas de não haver nenhum hospital (público ou privado) que o disponibilizasse.

Ou então, poderia dar-se o caso de haver clínicas que se instalassem para fazer abortos, mas que cobrassem preços muito elevados.

Em ambos estes casos, a votade da mulher seria efetivamente negada.

De facto, aquilo que se vai votar é, estritamente interpretado, um direito negativo. A mulher não passa a ter o direito ao aborto. Os hospitais é que passam a ter o direito de vender serviços de aborto.

O facto de o aborto não ser penalizado não implica que ele passe a estar disponível.

Comparando: há muita gnte em Portugal que gostaria de tratar os seus dentes cariados, mas que não o faz porque não tem dinheiro para pagar um dentista. A atividade dos dentistas está perfeitamente legalizada em Portugal. Mas isso não implica que todas as pessoas que tenham caries sejam capazes de as tratar.

Luís Lavoura

Mentat disse...

»»» E se, João, estiveste atento houve uma médica a trabalhar na Suiça que explicou como os abortos de portuguesas emigrantes na Suiça desceram drasticamente pelo facto de frequentarem consultas de aconselhamento.»»»

Caro JB

Eu reparei e reparei tambem que os numeros foram dados em percentagem e não em valores absolutos.
O que pode querer dizer uma de várias coisas :
1- Se o numero absoluto de abortos legais aumentou (como aconteceu em Inglaterra) a percentagem dos abortos realizados por Portuguesas teria obrigatoriamente de baixar.
2- A imigração para a Suiça de Portugueses baixou, logo baixou também o número mulheres Portuguesas em periodo fertil.
Etc.
Quando se mostram valores relativos e não absolutos, pode ser sempre tirar as conclusões que nos derem mais jeito.
.

Anónimo disse...

Eu reparei e reparei tambem que os numeros foram dados em percentagem e não em valores absolutos. - Mentat

É possível que sim, não sei. Confio em geral nos dados que são disponibilizados a menos que me provem que estão errados. Não sou economista.

JLP disse...

LL,

"Isto é falso. A vontade da mulher pode ser negada por ela não ter disponível em tempo útil e/ou por não ter dinheiro para pagar quem le faça o aborto.

[...]

Por exemplo, poderia dar-se o caso de o aborto ser despenalizado mas de não haver nenhum hospital (público ou privado) que o disponibilizasse.

De facto, aquilo que se vai votar é, estritamente interpretado, um direito negativo. A mulher não passa a ter o direito ao aborto. Os hospitais é que passam a ter o direito de vender serviços de aborto."

O caro LL deve viver na LaLa Land, presumo. E só agora parece ter começado a discutir os problemas levantados pelo referendo. Só assim será de compreender que esteja tão fora das declarações mais que públicas de vários apoiantes do Sim e do nosso exmo. ministro da Saúde relativas a quem é que vai pagar a factura e ao papel que o SNS vai ter no eventualmente futuro aborto livre até às 10 semanas.

Ou então está a fazer-se de desentendido e de má-fé.

JB,

O argumento do Mentat não é de ignorar. É verdade que os números são os números. Mas o que foi apresentado não foram números oficiais, mas em grande parte os resultantes duma experiência pessoal, limitada a um serviço que presta na Suiça esse género de serviços.