2006/09/27

Por isso é que eu gosto de castanhas

Caso 1:
Os hospitais são públicos. O senhor X vai ao hospital com uma doença simples que não lhe é diagnosticada. Morre passado uns dias de ser enviado para casa. Aceita-se que um médico pode errar, leva uma suspensão e volta ao activo.

Caso 2:
Os hospitais são privados mas os tratamentos são feitos com dinheiros públicos. O senhor X vai ao hospital. Como a doença é de tratamento simples (barato) não existe grande incentivo a descobri-lo. Morre passado uns dias de ser enviado para casa. O hospital é privado mas os dinheiros públicos sustentam-no e os utentes não têm alternativa, continuam a frequentar o hospital e o mesmo médico.

Caso 3:
Os hospitais são privados. Há hospitais a concorrer pelos mesmos pacientes. O senhor X vai ao hospital com uma doença simples que não lhe é diagnosticada. Morre passado uns dias de ser enviado para casa. O hospital perde pacientes, o médico é despedido e dificilmente arranjará outro emprego. Como baixa o número de pacientes, o restante staff também sofrerá as consequências (despedimentos, redução de benefícios,...). O proprietário do hospital verá os seus lucros diminuídos. Haverá um maior investimento em métodos de diagnóstico e um aumento do controlo recíproco das acções do staff (um segundo caso levaria à falência do hospital).

Pergunta para pulhas de direita e meninas bonitas de esquerda?
1. Em qual dos casos haveria menos mortes?
2. Até que ponto a certificação estatal dos médicos/medicamentos é relevante para a resposta anterior?

8 comentários:

AA disse...

1. Mesmo número de mortes em todos os casos. Morre uma pessoa por não lhe ter sido diagnosticada uma doença. Mas o caso 3 é o que mais tenderá a adaptar-se, por ser incomportável "perder" continuamente pacientes; porque os clientes tenderão a abandonar os serviços; por ser lucrativo tratar bem as pessoas melhor do que a concorrência. Claro que é preciso que a Justiça funcione. Há outro factor igualmente importante: "você tem esta doença mas não arriscamos tratá-la" - também o caso das malévolas seguradoras. Não é discriminação, é informação acrescentada quando antes não existia e por isso morria gente...

2. não é. Médicos e medicamentos certificados podem deixar morrer, como médicos e medicamentos não certificados podem salvar. Aliás, quanto mais restrita for a concorrência por acção da certificação, menos incentivos terão os médicos e farmacêuticas a prestar um serviço melhor que os concorrentes...

Carlos Guimarães Pinto disse...

Sim, a pergunta 1 está mal formulada, mas penso que dá para entender a ideia. O termo pulha é obviamente um termo carinhoso... :)

AA disse...

:)

Pedro Santos Cardoso disse...

Eu também gosto de castanhas, no Dolo Eventual. :)

Vítor Jesus disse...

Q1: hipersimplificaste a coisa. Em Cuba há excelentes hospitais...

Q2: pergunta-resposta: se não fosse necessário certificação, nem cursos superiores "normalizados" precisaríamos pq o que interessa é uma espécie de "long-term constant" (no teu racicínio).

De forma geral, a saúde não é um tema que se deva ser tratado por tentativa-e-erro como queres sugerir. Ou seja, vamos deixando as pessoas morrer e vamos deixando o mercado funcionar para dele retirar conclusões estatísticas. No fim do processo, de long-term contasnt, qdo o estado estacionário for atingido, teremos um mercado consolidado e perfeito.

Versão mórbida: dado que sou engenheiro, qtas gerações vão ter de "morrer" para deixar o mercado estabilizar? 0.01, menos mal; 0.1, muito perigoso; 1, inaceitável; se 10, inadmissível, .....

Há coisas que o Estado _TEM_ de chamar a si e a saúde é uma delas. A saúde nunca poderá ser totalmente privada e o melhor que se pode propôr são modelos mistos. A SegSocial (de um ponto de vista lato) é outra.

Carlos Guimarães Pinto disse...

Pedro, respondo-te lá no dolo!

Vítor,
O sistema de mercado não é de tentativa e erro. Pelo contrário, o sistema de incentivos e penalizações do mercado, impede que aconteçam muitos dos erros que um sistema estatizado não impede. A minha exposição visava exemplificar precisamente isso. Num sistema público, a punição por erros médicos e o incentivo à cura não é tanto como num de mercado. Nos EUA os hospitais pagam avultadas indemnizações pelos erros que cometem e ainda são penalizados pelo mercado. Em Portugal não há alternativa...

JLP disse...

Concordo com o Karloos. Aliás já referi várias vezes que um dos problemas na relação do estado com as tarefas que lhe são conferidas (ou de que este se apropria) é exactamente o desaparecimento da noção de risco.

Acontece isso na saúde, nas empreitadas e outros.

Para quem tem o monopolio do poder coercivo, em última instância a noção de risco associado às actividades em que intervem desaparece. Para o estado é indiferente que algum doente morra, fique mutilado ou que não sejam cumpridas as próprias condições de fornecimento do serviço a que se propõe. A responsabilidade pode ser sempre transferida para os funcionários, o processo pode ser enterrado num tribunal, o enquadramento legislativo alterado ou o assunto nem sequer ser investigado ou não se conseguir acercar a culpa a uma pessoa ou entidade concreta.

Separar quem tem a responsabilidade de prestar um serviço (e o risco a ele associado) de quem julga, policia e define os moldes da prestação do serviço (caso se ache tal intervenção imprescindível) é uma preocupação de simples higiene e boas práticas básicas.

Anónimo disse...

pergunta ao bloguista:

näo sabe que "staff" em português é "pessoal"?

näo de diga, também separa as vírgulas com pontos?