O monopólio da força
A partir de Novembro, quem passar numa portagem sem pagar vai ser multado em pelo menos 25 euros pelos agentes das concessionárias das auto-estradas e pontes, dispensando-se uma decisão dos tribunais. A lei 25/2006 foi hoje publicada em Diário da República e entra em vigor em Novembro.Um dos papéis em que (até) os liberais costumam concordar que deve ser uma competência exclusiva do estado é o de este ser detentor do monopólio da força, ou seja, que deve ser um monopólio do estado o conjunto de poderes e de tarefas associados à segurança pública e à aplicação e enforcement da legalidade e da ordem jurídica, papéis normalmente exercidos pelas forças de segurança, pelos militares e pelos tribunais. Ora na ânsia de fazer passar tudo o que é comportamento e acto tomado em sociedade pelo crivo da Lei, culminado numa espiral verborreica legislativa que todos conhecemos, o que se tem assistido é a um progressivo esgotamento da capacidade do estado de exercer esse monopólio, seja por progressiva escassez da capacidade de policiamento de toda a miríade de actos sancionados como "ilegais", seja pelo progressivo atulhamento dos tribunais com bagatelas jurídicas. Qual é a reacção do estado? Em vez de simplificar os ordenamentos legais e tentar agilizar os processos de detecção de infracções e seu posterior processamento, a tendencia do estado é de prescindir progressivamente do seu monopólio e de atribuir funções geralmente associadas ao exercício da função pública a entidades e pessoas sem particular legitimidade pública para o efeito.
A lei 25/2006 - a que a agência Lusa teve acesso - pretende aliviar os tribunais do peso dos processos sobre a utilização fraudulenta das infra-estruturas rodoviárias, conferindo aos portageiros competências de fiscalização.
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Depois de detectada a contra-ordenação, as concessionárias notificam o condutor faltoso para pagar a coima no prazo de 15 dias e, se o pagamento não for feito, notificam a Direcção-geral de Viação (DGV) para lavrar um auto de notícia e, eventualmente, enviar o processo para os tribunais.
Público Última Hora (com negritos meus).
De que outra forma se pode compreender que, pelo simples facto de se ser funcionário de uma companhia privada que presta serviços em regime de concessão ao estado, como é o caso da Brisa e dos seus funcionários portageiros, estes passem a adquirir efectivos poderes público de sanção de contra-ordenações? Está tudo doido? Será que a tarefa de fiscalização dessas contra-ordenações é uma tarefa assim de tão especial complexidade, ou será o estado completamente incapaz de a exercer? Será que um dia destes temos os donos dos cafés das praias ou os nadadores-salvadores também a passar multas pela violação da famosa nova lei da bandeira vermelha?
Mas uma questão extremamente grave, e que passará eventualmente despercebida numa primeira leitura do artigo mas que é demonstradora da leviandade com que o estado lida com os seus cidadão e com a sua privacidade, é o que está expresso no terceiro parágrafo transcrito do artigo: se se assume que passarão a ser as concessionárias a fazer a notificação dos condutores presumíveis faltosos, através de dados de video ou foto-vigilância, surge a questão de como terão estas acesso aos dados relativos aos proprietários das viaturas através da matrícula, nomeadamente o nome e a morada. Só se poderá presumir que para tal se irá conferir a possibilidade de as concessionárias terem acesso às bases de dados de matrículas e proprietários automóveis. Com que direito? Com que leviandade se autoriza uma entidade privada a aceder a este género de informação? Com que controle?
Um estado capaz e credível dá-se ao respeito e demonstra que é capaz de exercer as suas funções. Um estado totalitário e securitário abdica do seu monopólio da força e torna todos na polícia e nos vigilantes do politicamente tolerado.
2 comentários:
O mais fácil é mesmo... acabar com as portagens!
Isso é outra guerra... ;)
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