2006/06/26

Memórias incómodas curiosamente esquecidas pelo jornalismo nacional

Figo criticised Deco's inclusion when he was first called up in 2003 and the Real Madrid star fanned the flames of their row in an El Pais interview.

"I don't think people would be happy in Spain if I became a Spanish national and played for the Spanish side."

"It's something that distorts team spirit and I don't agree with it."

Figo added: "If you're born Chinese, well, you have to play for China.

"I have nothing against those who do that but it's superficial.

"It looks like you're trying to take advantage of something. That's my opinion and I'm not going to change it because he is in the team."

Luís Figo, 10 de Junho de 2004.
São tão esquecidas que a única citação que consegui encontrar foi da BBC News.

Não há nenhum jornalista voluntarioso que ainda não se tenha submetido ao estatuto de cheer-leader da selecção e não tenha entregue a carteirinha profissional em troca de um cachecol e de uma fotografia autografada do sr. Scolari que pergunte ao Sr. Figo se ainda pensa da mesma maneira?

8 comentários:

Carlos Guimarães Pinto disse...

Não vejo porque é que é incómoda. É a opinião de Figo e nunca o vi a desmenti-la. O Figo tem direito a expressá-la e é uma opinião aceitável, concorde-se ou não. Ele até teve o cuidado de generalizar. Nunca se soube que o Deco tivesse sido mal recebido na selecção pelo Figo ou por outro qualquer jogador. Foi discutida na altura em que interessava, e hoje o facto está consumado. Também eu discordo com a integração de jogadores e, acrescento, treinadores, estrangeiros nas selecções mas não deixo de vibrar cada vez que o Deco marca um golo pela selecção, ou deixo de atribuír o grande mérito de Scolari nos feitos recentes.
Desculpa, João, mas a referência a esta questão nesta altura só é demonstrativo de algum ressentimento para com Scolari, que alguns resolveram alargar à selecção, e mau perder injustificado (porque, supostamente, ganhámos todos).

Anónimo disse...

Pois, mas o Deco não só não distorceu o espírito de equipa na selecção, como temia Figo, como veio ajudar a subir (imenso) a qualidade do jogo colectivo, além da sua valia individual.
E quando o Figo acabar, lá ficará o Deco como... porta-bandeira.
Mas esse fadinho-fodinha que os escribas do reino foram alimentando então só aos desleixados e acríticos passa ao lado. Todos se esquecem, especialmente quem fez asneiras...

JLP disse...

"Não vejo porque é que é incómoda. É a opinião de Figo e nunca o vi a desmenti-la. O Figo tem direito a expressá-la e é uma opinião aceitável, concorde-se ou não. Ele até teve o cuidado de generalizar. Nunca se soube que o Deco tivesse sido mal recebido na selecção pelo Figo ou por outro qualquer jogador. "

- A questão não é se ele a desmentiu ou não. É tão somente uma questão de hipocrisia quando se vê hoje em dia em diversas situações o Figo aos "beijos e abraços" ao Deco em inúmeras situações. Acho que é de óbvio interesse jornalístico questioná-lo se hoje tem uma perspectiva diferente da que tinha quando emitiu a sua opinião. É obviamente livre de o fazer e naturalmente não lhe quero de algum modo tirar essa oportunidade. Mas assim como tem a liberdade de tomar as suas decisões, esta deve ser acompanhada pela responsabilidade de as ter tomado. Já quanto ao facto de ter sido ou não mal recebido na altura, não me referi a isso, mas era opinião vulgar da época que havia um "núcleo duro" no balneário, essencialmente constituido pelo Figo, pelo Rui Costa e pelo Fernando Couto que não foram propriamente a comissão de vizinhança aquando da sua convocatória. Aliàs, a própria oportunidade da declaração do Figo diz muito da convulsão que deveria ir correndo dentro de portas.

"Desculpa, João, mas a referência a esta questão nesta altura só é demonstrativo de algum ressentimento para com Scolari, que alguns resolveram alargar à selecção, e mau perder injustificado (porque, supostamente, ganhámos todos)."

A questão que apresentei não tinha qualquer intenção relativamente ao Scolari, que nem sequer era referido. Continuo a achar que é um treinador mediano e um excelente psicólogo de grupo e de massas. Talvez a consumação da ideia de que para vencer no futebol é mais importante a teimosia e o marketing do que praticar bom futebol.

Mas a questão não era relativa a ele. Era sim relativamente a dois alvos em particular:

- O Figo, já que não gosto de hipocrisia nem de pessoas que mudam de palavra "qual pluma ao vento". Não concordo com todo o processo que o levou a integrar de novo a selecção, sejam quais forem os resultados desportivos que venha a apresentar. Há coisas que eu prezo mais que capacidade de "carregar pianos".

- A imprensa portuguesa. A mesma que clama fazer parte do olímpo da imparcialidade e que vem fazendo um péssimo trabalho nesse domínio, essencialmente largando a profissão de jornalistas e abraçando a de "entertainers". Quando vejo "jornalistas" com cachecóis da selecção em conferências de imprensa, com discursos mais de PR e publicitários da selecção, em que sacrificam o interesse jornalístico (e diga-se, comercial!) em prol da "estabilidade" da "nossa selecção", ou tentando não enervar os "artistas", o que é que aqueles senhores estão lá a fazer?

O mercado do jornalismo em Portugal presentemente é só o de anuência cega ao "desígnio nacional"?

Tenho noção dos excessos em que cai a imprensa inglesa. Mas talvez seja pedagógico verificar a maneira como a selecção deles é tratada pela imprensa, mesmo quando, como a selecção portuguesa, estão nos 4os de final.

Principalmente, acho que é preciso às vezes respirar e ver o que se vai passando quando a alienação colectiva vai tomando conta das várias facetas de toda uma sociedade.

Tenho as minhas diferenças em relação ao Scolari e às suas escolhas, quando prezo o princípio liberal de associar o mérito ao sucesso. Nada me opõe em particular a esta ou ao conceito de selecção. Mas não enveredo por esse discurso do "ganhámos todos", resquício do "interesse colectivo". Ganharam os portugueses que se revêm no desporto e naquela selecção. Por mim, apesar de (como sabes) forte defensor do conceito de soberania (mas não nacionalista), fora os eventuais proveitos económicos que surjam dos resultados desportivos, I don't give a damn...

Carlos Guimarães Pinto disse...

"Mas assim como tem a liberdade de tomar as suas decisões, esta deve ser acompanhada pela responsabilidade de as ter tomado"

Nunca vi o Figo a dizer que tinha mudado de opinião. Mas o Figo não manda na selecção, nem nas opções do seleccionador. Discordando, respeitou-as. Não há qualquer incoerência no facto de se abraçar ao Deco nos momentos de vitória. Ele pode continuar com a mesma opinião e respeitar as decisões da Federação. Da mesma forma que o Ricardo Costa não concordará com a convocatória do Boa-Morte mas celebrará um golo seu se ele vier a marca-lo. O que está implícito no que tu dizes é que haveria uma inimizade específica para com o Deco e hoje por conveniência não há. Parece-me óbvio que nunca foi a convocação do Deco que Figo esteve contra, mas sim o princípio geral de convocar "estrangeiros".

JLP disse...

"Nunca vi o Figo a dizer que tinha mudado de opinião."

Alguém lhe perguntou? Não achas que é uma situação com óbvio interesse jornalístico?

"Não há qualquer incoerência no facto de se abraçar ao Deco nos momentos de vitória. Ele pode continuar com a mesma opinião e respeitar as decisões da Federação."

Poderá não haver incoerência, porque no fim festeja golos que também a ele beneficiam. Mas não haverá uma grande dose de hipocrisia?

Se o Di Canio jogasse na selecção e viesse a público dizer que não queria pretos lá porque desvirtuavam a imagem que ele tinha de uma "selecção italiana", e depois fosse visto aos "beijos e abraços" com o seu recém-adquirido colega de selecção de côr não achavas uma hipocrisia ou pelo menos não acharias interessante questioná-lo relativamente à sua mudança de atitude?

"O que está implícito no que tu dizes é que haveria uma inimizade específica para com o Deco e hoje por conveniência não há. Parece-me óbvio que nunca foi a convocação do Deco que Figo esteve contra, mas sim o princípio geral de convocar "estrangeiros"."

Sem dúvida que há a conveniência. Naturalmente que ele teve o cuidado de não individuallizar, mas o comentário não foi extemporâneo. Teve um timing bem definido, da sua iniciativa, e não se tratou da avaliação de uma "questão conceptual". Coincidiu com a discussão da possíbilidade do Deco se naturalizar e integrar a selecção, curiosamente num lugar que até lhe poderia fazer alguma ameaça.

Apesar das suas palavras terem sido cautelosamente genéricas, não é preciso ter sensibilidade extra-sensorial para perceber de quem ou de que situação estava a falar em concreto. Sejamos claros! A única alternativa à critica personalizada era o ele ser pura e simplesmente um sonso, o que me parece ser bastante mais improvável.

Além disso, o Figo nunca demonstrou problemas em ser crítico da própria estrutura e actuação da FPF, portanto não me parece que tenha sido nesta situação em concreto movido por algum espírito diferente de todas as outras. O que muito simplesmente aconteceu foi que entretanto teve o seu estatuto de "estrela em despedida" no Euro e as suas posteriores fériazinhas sabáticas (enquanto os outros roiam os ossos), e quando desceu do Olimpo viu que tinha o apoio do Scolari para jogar, não se sentido ameaçado na sua titularidade. Tivesse a situação sido diferente e se calhar tinha estalado o verniz.

Agora ingénuo é achar que durante todo este tempo uma pessoa com o feitio demonstrado do Figo mudou pacificamente de opinião, e coibir-se de o inquirir nesse sentido por medo de ferir as susceptibilidade.

Carlos Guimarães Pinto disse...

As situações do Figo e do di Canio são completamente diferentes. O di Canio tem um ódio a raças diferentes que se estende para além do campo de futebol. Figo nunca disse que não gostava de brasileiros; disse apenas que não achava que eles devessem ser incluídos na selecção portuguesa. Não há comparação possível entre os dois.


"Alguém lhe perguntou? Não achas que é uma situação com óbvio interesse jornalístico?"

E quando é que deviam ter perguntado? antes do mundial? depois? Durante? Em Janeiro? Em Abril? De 15 em 15 dias ou de cada vez que houvesse um estágio da selecção, só para ir verificando se ele tinha mudado de opinião? A situação teve o interesse que teve na altura, e o Figo expressou a sua opinião quando valia a pena ouvi-la.
Há parcialidade dos jornalistas? Sem dúvida. Mas não é por aí que se nota...

Unknown disse...

Parece-me que há aqui uma questão conveniente (tendo em conta a temática do blogue) e que ainda não vos ocorreu abordar relativamente a isto. Já repararam que ser português e potencialmente tornar-se jogador da selecção sem contestação depende apenas de nascer ou ser descendente de alguém que nasceu nas fronteiras definidas por um Estado?

Quem nascer em Badajoz ou Tuy, por muito semelhantes que possam ser a Elvas e Valença, respectivamente, está condenado a representar uma selecção diferente. A nível peninsular, as províncias de Castela, Astúrias, Galiza, etc. estão condenadas a jogar lado a lado com Valência, Catalunha, Baleares quando estão muito mais próximas cultural e etnicamente ao Norte de Portugal (Andaluzia e Extremadura ao Sul). O mesmo acontece com províncias do sul de França e algumas do lado espanhol [Occitania], ou se quisermos, as questões singulares do país basco e Cantábria.

O estabelecimento das fronteiras estatais deu-se por razões meramente políticas (como casamentos por motivos dinásticos e anexações militares) e não resultou de uma emergência natural e espontânea de nações.

Claro que segundo este critério, provavelmente o Deco e outros não entravam na selecção mas não deixa de ser relevante que o que fica sempre em discussão é o facto de terem nascido ou não dentro da fronteira.

JLP disse...

Karloos,

"Figo nunca disse que não gostava de brasileiros; disse apenas que não achava que eles devessem ser incluídos na selecção portuguesa."

O que materialmente e eficazmente se reflete na exacta mesma coisa que se fosse o Di Canio. É só uma questão de motivações diferentes. Mas acho que indiferentemente das motivações, a hipocrisia existiria posteriormente nos dois casos.

"E quando é que deviam ter perguntado? antes do mundial? depois? Durante? Em Janeiro? Em Abril? De 15 em 15 dias ou de cada vez que houvesse um estágio da selecção, só para ir verificando se ele tinha mudado de opinião? "

Quando a atitude do Figo mudou da frieza com que o Deco foi recebido para a efusividade do clube dos bons rapazes actual.