2006/03/12

Curiosidades socialistas

O secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Jorge Lacão, anunciou hoje que o Governo admite vir a criminalizar, no âmbito da revisão do Código Penal, os clientes da prostituição forçada com origem no tráfico de mulheres.

[...]

Para o secretário de Estado, "a prostituição não prescinde de uma atitude ética, porque a exploração sexual não é apenas um problema de gostos, colide com a preservação da dignidade humana".

Considerando que Portugal "tem sido muito tolerante relativamente aos clientes", o governante afirmou que o país deve agora interrogar-se sobre "se a tolerância faz sentido ou não é ela a expressão mais relevante da hipocrisia".

Público Última Hora, com negritos meus.


Andavam já por aí há algum tempo as hostes a clamar que "era desta", no período socrático, que finalmente ia vingar a legalização da prostituição, de preferência de carteirinha profissional, a pagar multas e impostos, e apertadamente regulada pelo estado.

Mas o que muitas dessas pessoas se esquecem é que, actualmente, a prostituição não é sequer ilegal em Portugal: é mais do que isso livre! Não existe qualquer impedimento ou qualquer forma de coação legal para que qualquer pessoa em liberdade se possa prostituir ou ser cliente de prostituição se tal for a sua vontade. Se existe alguma questão a resolver, ela é tão somente de justiça fiscal no actual quadro, mas que será de todo uma questão pouco prioritária.

No actual código penal, qualquer pessoa que dolosamente use de serviços de prostituição, recorrendo a pessoas traficadas ilegalmente, já é alvo de sanção, uma vez que a sua participação o torna cúmplice da situação de tráfico. O que o Dr. Lacão vêm propor, de peito cheio da sua "atitude ética" e dos seus "gostos", é sim que passe a ser estabelecido um mecanismo de ameaça a todos os potencias clientes de prostituição, mais condizente isso sim com uma situação de ilegalização da prostituição de que à manutenção da presente liberalização ou a uma eventual "legalização".

A menos que se torne obrigatório carimbar a nacionalidade das pessoas na testa quando entram na fronteira, é fácil questionar a exequibilidade da proposta, e de antever o efeito perverso do ónus que se iria incutir aos eventuais clientes.

É de questionar também porque deverá ser criado um regime de excepção para esta actividade em particular, quando a privação forçada da liberdade ou o uso de mão-de-obra ilegal é já ilegal (e bem) para todas as pessoas e actividades profissionais, tendo o caso da prostituição até já presentemente o regime de excepção da criminalização do lenocínio.

Só se pode constatar das afirmações do Dr. Lacão que afinal ninguém tem mesmo no panorama político luso o monopólio do conservadorismo e do moralismo bacôco. E que há muitos, mesmo muitos dos políticos do sistema sempre prontos a diminuir a liberdade individual, promovendo legalizações e "regulamentações" para que possam arrecadar mais uns trocos mas para que também possam manter a sobranceria moral à sua medida.

3 comentários:

Vítor Jesus disse...

só para separar as coisas: uma coisa é o princípio, outra é a materialização/aplicação do princípio. Eu acho bem que a prostituição consentida (o toma-lá-dá-cá) seja legal pq isso vai do juízo de cada um. Mas lá por ser complicado fiscalizar o toma-lá-dá-cá, não quer dizer que não tenha corpo de lei.

De resto, isto parece aquelas moraizinhas de cabeceira mais próprias de beatas que vão à missinha ao domingo e à semana andam a cortar na casaca dos vizinhos. Os problemas morais que esse Lacão deve ter... Deve dar pa escrever um livro. O 24 Horas era gajo pa pegar nisso.

JLP disse...

"Mas lá por ser complicado fiscalizar o toma-lá-dá-cá, não quer dizer que não tenha corpo de lei."

Só para clarificar: a questão é para que é que é preciso sequer materializar isso em termos de lei, se:

- O sequestro já é criminalizado.

- O tráfico de pessoas destinado a sua exploração sexual também.

- Qualquer pessoa que se aproveite dolosamente de alguém traficado nessas circunstâncias também, porque se torna cúmplice.

Porque é que é necessário construir uma nova moldura penal, senão para pura e simples coação e ameaça aos clientes da prostituição?

Vítor Jesus disse...

era mais um comentário genérico... até acho que a lei em Portugal está bem (embora não conheça pormenores e me vá guiando pelo que se diz) pelas razões que apontas.