2007/11/03

Os inexplicáveis anos 80



Aqui partilho um momento fantástico dos anos 80. Apesar de estarmos aqui em 1978, Alexandrie Alexandra do Claude François é um prenúncio da década que se segue. A música quer-se colorida e cheia de adereços kitsch. A grande inovação neste clip é a coreografia. Desenganem-se aqueles que pensam que os movimentos são improvisados de forma um pouco trapalhona, pois cada movimento aqui é estudado ao pormenor e desenvolvido por coreógrafos profissionais. A cena de abertura em que Cloclo flecte os braços repetidamente de forma sincronizada demonstra isso mesmo: o anúncio de uma coreografia em que se inverte a subordinação ilustrativa. O coreógrafo quer-se como o típico gestor de recursos humanos que anuncia avultadas somas em acções de formação, ou o IT Manager que requer equipamentos topo de gama sem saber qual o propósito da modernidade, ou o primeiro ministro que distribui computadores com ligações wireless sem saber se as embalagens serão sequer abertas. É desse modo que se anuncia a descoordenação de movimentos em palco, sem saber muito bem qual o destino a dar-lhes. Importante é anunciar que eles existem. O espectador impávido rende-se à inovação. Pouco importa o grotesco. O rei vai nu, certo, mas antes de reparar que ele vai nu, note-se que ele vai. Note-se como o rei apresenta o traseiro espetado aos seus súbditos enquanto levanta o braço. Não, não vale a pena buscar uma interpretação para tal pose. Pura abstração gestual. O pobre Cloclo não beneficiaria de qualquer tentativa de interpretação neste contexto. Desprovidos de qualquer sensualidade, as poses sucedem-se num crescendo de actos falhados. O resultado não poderia ser outro: um sucesso estrondoso entre o público feminino ao assistir à desmistificação do seu ícone. Afinal, a sua vedeta é capaz de actos falhados. Cloclo finalmente mais alcançável. Poucos foram os artistas que não sucumbiram nesta época, do mesmo modo. No caso de Claude Fraçois, perdeu-se mais do que o artista, como também a vida do homem num infeliz acidente doméstico em que ele não sobreviveu, ao tentar mudar uma lâmpada por cima da banheira cheia de água.

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