Cala-te senão Levas
Pereira Coutinho terá sido multado em 50 mil euros pela CMVM.
Não deixo de achar estranho o tempo verbal que utilizado para efeitos jornalísticos quando se quer expressar uma incerteza factual, ou mesmo distanciamento em relação à fonte citada. O uso do futuro anterior é no mínimo ambíguo. Indica neste caso que o Pereira Coutinho é multado numa altura que se desconhece estar no futuro ou no passado. Este tempo exprime a redundância que ao saber que a multa é passada, existirá um tempo futuro em que esse facto se torna num passado. Basta esperar o suficiente. É uma maneira um pouco trapalhona de expressar distância entre o jornal e a sua fonte, não tomando partido desta última. Na língua alemã existe um modo verbal que tem a utilidade específica de se distanciar da fonte em casos de reported speech, chamado Konjunktiv I. O primeiro conjuntivo é uma forma muito elegante de o fazer:
Exemplo da actualidade:
Um porta-voz da família disse que Kate McCann já teria contado com o facto de ser constituída arguida.Mas pergunto então, teria contado quando? Desde o início do inquérito? Antes de começar a angariar dois milhões de libras? Desde a semana passada? Apenas se diz que existirá um momento futuro, algures num tempo que pode ser muito remoto, em que a Kate percebe que contou com o facto de ser constituída arguida, e isso é passado para ela. Neste momento não se sabe se é passado ou futuro. Se calhar já foi constituída arguida por esta hora e ainda não conta com o facto consumado. É esse o ridículo do uso deste tempo verbal.
Já o texto em alemão é claro:
Ein Sprecher der Familie teilte mit, Kate McCann habe selbst damit gerechnet, zur Verdächtigen erklärt zu werden.Só que tal tempo verbal não existe na nossa língua, o que é uma grande lacuna. Outra falha muito grande na língua portuguesa: não existir a palavra Garçon, e ter constantemente que chamar o Olhe-Fachavor no restaurante.
Um porta-voz da família disse que Kate McCann já contava-mas-não-pensem-que-sou-eu-que-o-digo-é-o-porta-voz-que-o-diz com o facto de ser constituída arguida.
2 comentários:
Caro Filipe,
O verbo em alemão exprime exactamente o mesmo que o verbo português. "Habe gerechnet" é o mesmo que dizer "teria contado". Parece-me..:)
"teria contado" daria textualmente em alemão "hätte selbst damit gerechnet"
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