2007/05/02

Manual de instruções para crimes banais

A proposta de lei anti-tabaco que o Parlamento discute amanhã na generalidade poderá obrigar os proprietários dos cafés e restaurantes com menos de cem metros quadrados a denunciar os clientes fumadores.

De acordo com a proposta de lei caberá ao proprietário do estabelecimento "chamar as autoridades administrativas ou policiais, as quais devem lavrar o respectivo auto de notícia".

Por seu lado, os restantes utentes dos serviços que defendam o cumprimento da lei e se deparem com a sua infracção, poderão apresentar "queixa por escrito, circunstanciada, usando para o efeito, nomeadamente, o livro de reclamações disponível no estabelecimento em causa".

Público Última Hora.
Nos tempos presentes, em que se nota uma encarecida vontade do nosso estado em trazer de volta o passado e promover a herói nacional e a cidadão modelo da república o bufo, fica a minha sugestão de combate à eminente entrada em vigor da lei que se anuncia, nomeadamente pelos proprietários de estabelecimentos que não estejam dispostos a perder clientes num espaço que desejam que se mantenha aberto a fumadores:
  1. Telefonar para a polícia, pedindo a identificação do agente que o atende ao telefone.
  2. Anunciar que se encontra alguém a fumar no estabelecimento e que se pretende que um polícia se desloque ao local e tome conta da ocorrência, de modo a ilibar a sua responsabilidade no facto.
  3. Aguardar a chegada da polícia.
  4. Quando esta chegar, dizer que quem estava a fumar já se foi embora.
  5. Repetir de meia em meia hora, ou com a periodicidade que se achar conveniente.
  6. Se a polícia não aparecer, dirigir-se à esquadra e apresentar queixa de quem o atendeu, dizendo que não foram tomadas as iniciativas necessárias a evitar que o comportamento faltoso continuasse, e a ilibar o comerciante da sua responsabilidade.
Deste modo, ficam salvaguardadas as possíveis queixas no livro de reclamações: afinal, foi feita a devida denúncia. Além disso, se alguém for apresentado em flagrante, o proprietário poderá alegar que as suas queixas são sucessivamente ignoradas, e que nada pode fazer para de outro modo impedir o comportamento.

Recomenda-se portanto a primeira denúncia logo após a abertura.

23 comentários:

Mentat disse...

Caro JLP

Não esquecer mais as seguintes medidas :
1. Instalar correntes e algemas no estabelecimento, para comprovar a boa fé do comerciante, na tentativa de reter o criminoso até à chegada da Policia
2. Instalar câmaras de vigilância para gravar imagens dos criminosos, mas esperar calmamente pela licença para as por a funcionar.

Se o ridiculo matasse ...
.

Mentat disse...

Nota :
Eu não fumo e detesto que fumem ao pé de mim.
.

Mentat disse...

Claro que fazer cumprir os regulamentos já existentes há anos, quanto à ventilação dos estabelecimentos comerciais, que permitiria nas calmas a convivência entre fumadores e não fumadores, daria muito mais trabalho e muito menos "sound bytes".
.

JLP disse...

"Eu não fumo e detesto que fumem ao pé de mim."

Eu também.

Ou melhor, não fumo, e detesto que em algumas circunstâncias fumem ao pé de mim.

Nada que não se resolveria com alguma boa-educação e civismo.

Mas o problema, quanto a mim, nem é tanto o convívio entre fumadores e não-fumadores. É o da liberdade de cada comerciante dever poder decidir no seu estabelecimento e propriedade se este é para clientes fumadores ou não-fumadores, sendo estes claramente informados dessa decisão.

Mentat disse...

"Nada que não se resolveria com alguma boa-educação e civismo."

Isso é obviamente verdade.
Mas como a "boa-educação e civismo" não são a qualidade dos Portugueses mais em voga nesta altura, o Governo recorre a outra "qualidade" dos Portugueses infelizmente sempre na moda - o bufismo.
.

Mentat disse...

"É o da liberdade de cada comerciante dever poder decidir no seu estabelecimento e propriedade se este é para clientes fumadores ou não-fumadores, sendo estes claramente informados dessa decisão."

Caro JLP

É nestes assuntos é que considero que os liberais portugueses deviam "descer à terra".
Veja o seu próprio "lapsus linguae" :
- Juntou "dever" com "poder" decidir.
Afinal em que é que ficamos :
Devem - imposição, ou, podem - liberdade ?

É que essa "liberdade" seria uma imposição que os comerciantes teriam de cumprir e para a qual a situação económica não os ajuda.
Na realidade os proprietários de estabelecimentos com menos de 100 m2, não estão em condições económicas de ter espaços segregados e perder uma parte da clientela.
.

Mentat disse...

Não me parece que seja um atentado à liberdade de ninguém a imposição de regras de higiene e salubridade em estabelecimentos abertos ao público.
Existem regulamentos, métodos e tecnologias que permitem que que eu me sente num restaurante em frente dum fumador sem me sentir incomodado.
Não devia ser esse o caminho a seguir ?
E se alguns restaurantes óptimos que conheço com salas minúsculas,optassem por ser para fumadores ?
Não seria isso um atentado à minha liberdade ?
E se a minha mulher fumasse, cada um de nós teria de janatar em restaurantes diferentes ?
.

Anónimo disse...

small brother,
se bem que me ri um bom bocado com a sua proposta, acho as suas lamúrias perfeitamente disparatadas. estar a tomar o pequeno almoço ao lado de um fumador num café aberto a fumadores e a não fumadores, é a mesma coisa que achar que almoçar ao lado de um tipo que está a sulfatar a sua mesa com um pouco de fungicida é perfeitamente inócuo. acho muito bem que um cliente que não sinta a sua saúde protegida num café peça o livro de reclamações. estamos pouco habituados a respeitar os outros. concordo com zonas para fumadores ao ar livre. e sou contra o facto dos estabelecimentos não terem liberdade para escolher se se destinam a fumadores ou a não fumadores...

JLP disse...

"estar a tomar o pequeno almoço ao lado de um fumador num café aberto a fumadores e a não fumadores, é a mesma coisa que achar que almoçar ao lado de um tipo que está a sulfatar a sua mesa com um pouco de fungicida é perfeitamente inócuo."

É a sua opção lá continuar a ir, sabendo que tal poderá acontecer por o estabelecimento estar aberto a fumadores e não-fumadores.

"e sou contra o facto dos estabelecimentos não terem liberdade para escolher se se destinam a fumadores ou a não fumadores"

Está a ver que até concordamos, e que até há razão para "lamúrias"?

JLP disse...

"- Juntou "dever" com "poder" decidir.
Afinal em que é que ficamos :
Devem - imposição, ou, podem - liberdade ?"

Naturalmente o "podem".

Acho que a salvaguarda legal deverá ser unicamente no domínio de a afirmação dessa escolha (entre os três cenários: fumadores, não-fumadores e misto) deve ser clara para o consumidor que frequenta o estabelecimento. Foi esta constatação que modivou o acrescento do "devem", mas presumo que assim fica clarificado.

JLP disse...

"Não me parece que seja um atentado à liberdade de ninguém a imposição de regras de higiene e salubridade em estabelecimentos abertos ao público."

A mim também não, desde que sejam razoáveis, nomeadamente obrigações que clarifiquem o âmbito e as condições do contrato que é estabelecido entre o dono do estabelecimento e os seus clientes.

Apesar de tal, provavelmente, poder ser resolvido num âmbito puramente privado e contratual, não me repugna que o estado possa exercer a sua função reguladora impondo que estas sejam apresentadas de modo claro.

"Existem regulamentos, métodos e tecnologias que permitem que que eu me sente num restaurante em frente dum fumador sem me sentir incomodado.
Não devia ser esse o caminho a seguir ?"

Isso não deveria poder ser imposto de forma regulamentar. Devia ser uma maisvalia que podesse ser adoptada pelo dono do espaço em liberdade, e com vista a aumentar a preferência dos seus clientes.

"E se alguns restaurantes óptimos que conheço com salas minúsculas,optassem por ser para fumadores ?
Não seria isso um atentado à minha liberdade ?"

Não. Pelo menos no ponto de vista de liberdade negativa defendida pelos liberais. O Mentat não tem o "direito" de ir ao restaurante, e ainda mais de lhe impôr as suas opções de vida. Este é que terá o direito de estabelecer as suas regras e "formatos". Se forem do seu agrado, vai lá. Se não, vota com a carteira e vai a outro lado.

O Mentat é que teria que decidir aquilo que dá mais valor: o restaurante "óptimo" ou a sua possibilidade de disfrutar a sua refeição sem fumo.

"E se a minha mulher fumasse, cada um de nós teria de janatar em restaurantes diferentes ?"

Isso teria que ser algo a ser resolvido entre vós. Com as vossas prioridades.

Anónimo disse...

JLP

defende que os donos de restaurantes e cafés devem ter o direito de determinar se nos seus estabelecimentos é ou não proibido fumar.

Pergunto: esse direito também deve ser concedido aos donos de TODOS os outros estabelecimentos?

E pergunto: os donos de estabelecimentos também devem ter outros direitos, como, por exemplo, o de proibir discricionariamente certas pessoas de utilizar esses estabelecimentos?

É que, se o JLP defender, de forma ampla, esses direitos, chegaremos a uma sociedade potencialmente totalmente discriminatória, na qual certos cidadãos poderão nem ter a possibilidade de entrar numa mercearia para comprarem um pão para comer.

Chegaremos a uma sociedade onde não haverá quaisquer serviços mínimos nem quaisquer serviços públicos. Basta que todos os proprietários de todos os estabelecimentos de um determinado tipo decidam boicotar um certo tipo de clientes, para que esse tipo de clientes fique totalmente excluído.

Já hoje é isso que acontece com as pessoas alérgicas ao tabaco, em relação aos restaurantes.

Ou não é isso que o JLP defende? Ou será que o JLP admite que haja, algures, um qualquer limite ao total e absoluto direito de propriedade dos donos dos estabelecimentos?

Luís Lavoura

JLP disse...

"Pergunto: esse direito também deve ser concedido aos donos de TODOS os outros estabelecimentos?"

Sim. Excepto aos estabelecimentos públicos.

"E pergunto: os donos de estabelecimentos também devem ter outros direitos, como, por exemplo, o de proibir discricionariamente certas pessoas de utilizar esses estabelecimentos?"

Sim. Devem ter todos os direitos que o Luis Lavoura tem na sua casa.

"É que, se o JLP defender, de forma ampla, esses direitos, chegaremos a uma sociedade potencialmente totalmente discriminatória, na qual certos cidadãos poderão nem ter a possibilidade de entrar numa mercearia para comprarem um pão para comer."

Sim. Apesar de a sua afirmação partir de pressupostos que estão, quanto a mim, errados:

- A existência de um suposto "direito positivo a comprar um pão para comer".

- A inexistência da possibilidade do indivídio providenciar ele próprio para as suas necessidades.

- Achar que as mercearias, por definição estabelecimentos virados para o lucro, não terão interesse em vender pão e, pior, que conseguirão sustentar esse bloqueio sem que ninguém tenha a tentação de o furar.

- Achar que a existência de uma "procura" de discriminados não vai criar uma "oferta" de serviços para eles orientados (eventualmente estabelecida por próprios indivíduos desse grupo).

- Achar que não existe um estado com a função última de assegurar a sobrevivência em condições de igualdade a esse indivíduo.

"Chegaremos a uma sociedade onde não haverá quaisquer serviços mínimos nem quaisquer serviços públicos."

Como é que pode saltar para essa conclusão?

A questão é que esses serviços públicos terão que ser assegurados pelo estado, não impostos a particulares.

"Ou será que o JLP admite que haja, algures, um qualquer limite ao total e absoluto direito de propriedade dos donos dos estabelecimentos?"

Admito. As liberdades negativas e o direito à propriedade (compreendendo o direito à integridade física) de cada um. Ninguém pode ser morto por entrar num estabelecimento que tem a porta aberta.

Mas também ninguém tem o direito de lá entrar impondo as suas regras às do proprietário.

Anónimo disse...

"esses serviços públicos terão que ser assegurados pelo Estado"

Hmmm, ideia interessante. Quer dizer que o JLP não protestaria se o Estado decidisse abrir em cada concelho uma cantina pública na qual fosse proibido fumar, cantina que faria concorrência (potencialmente desleal...) aos restaurantes já instalados?

Mais ou menos como na antiga RDA. Eu uma vez comi numa dessas cantinas (já na Alemanha unificada - nunca estive na RDA enquanto tal), e até se comia bastante bem, e barato...

Chegamos então à ideia de um liberal que acha bem que o Estado se ponha a pestar serviços a torto e a direito, a pretexto de alegadas insuficiências do mercado.

Luís Lavoura

Mentat disse...

" Este é que terá o direito de estabelecer as suas regras e "formatos". Se forem do seu agrado, vai lá. Se não, vota com a carteira e vai a outro lado."

JLP

Defende portanto que podem existir estabelecimentos abertos ao publico que não possuam WC para mulheres, informando expressamente à entrada que a sua presença não é permitida ?
Ou outros, que construam um murete aí uns 30 cm de altura na frente da porta, por forma a impedir a entrada de cadeiras de rodas, informando expressamente que não servem deficientes ?
Ou outros que proibam homosexuais?
Ou gordos ?
Ou pretos ?
Ou chineses ?
Ou... ?
.

Anónimo disse...

"Admito. As liberdades negativas e o direito à propriedade (compreendendo o direito à integridade física) de cada um. Ninguém pode ser morto por entrar num estabelecimento que tem a porta aberta."

E Morte lenta, é legítimo? Não é isso o tabaco?

JLP disse...

"Chegamos então à ideia de um liberal que acha bem que o Estado se ponha a pestar serviços a torto e a direito, a pretexto de alegadas insuficiências do mercado."

Eu não estou a dizer que "acho bem" ou que esses serviços devam ser providenciados pelo estado. Só estou a dizer que só faz sentido aplicar esse género de regras se o forem (o que não defendo que sejam).

São dois níveis diferentes do problema.

JLP disse...

Mentat,

Sim a todos.

Mesmo no caso particular dos deficientes, uma eventual obrigação que exista em relação a estes é do estado, e não dos particulares.

Assim como no caso presente dos arrendamentos, em que se alega que as rendas não são livres por razões "sociais" e de um suposto "direito à habitação", se está a misturar o abuso da propriedade privada, ao se impôr regras sobre as rendas cobradas por privados, quando isso deveria (num estado não puramente liberal mas mais liberal do que o que temos) ser uma responsabilidade do estado.

Ou seja, nesse caso, como no caso da acessibilidade dos deficientes, deveria ser o estado a intervir no mercado negociando com os privados a acessibilidade aos seus serviços.

Não sei se me fiz compreender...

JLP disse...

"E Morte lenta, é legítimo? Não é isso o tabaco?"

A questão é que, no caso de uma pessoa entrar voluntariamente e informada em propriedade privada onde se fuma, isso não é homicídio. Quando muito, é "suicídio lento".

Mentat disse...

"Sim a todos.

Mesmo no caso particular dos deficientes,... "

Caro JLP

Parabéns, normalmente nestes pontos os "liberais" tipo LL atrapalham-se com os complexos...
Eu não estou de acordo consigo, mas não pelos mesmos motivos desses "liberais", mas agora o trabalho não me permite continuar.
Talvez mais para a noitinha...
.

rkd disse...

Já agora, gostaria de suscitar a procura de uma solução não legislativa - se é que existe - para esta questão. O que deverá o jovem não-fumador-que-detesta-fumo fazer quando vai comer fora?

a)usar uma t-shirt que diz "Estou a comer. Por favor, não fume."
b)ir falar com cada uma das pessoas sentadas à sua volta - ou que se vierem a sentar - e explicar o seu problema contando com a sua compreensão
c)deixar de comer fora
d)desistir de respirar
e)começar a fumar
f)opção americana: comprar uma arma, entrar no restaurante preferido, massacrar os fumadores e pedir o prato do dia

JLP disse...

"Já agora, gostaria de suscitar a procura de uma solução não legislativa - se é que existe - para esta questão. O que deverá o jovem não-fumador-que-detesta-fumo fazer quando vai comer fora?"

- Ir só a sitios que lhe garantam ser para não-fumadores.

- Ponderar o equilíbrio que faz entre o que acha mais importante: preço, qualidade da comida, ambiente de fumadores...

As opções de a) a e) também me parecem aceitáveis...

Anónimo disse...

Só é lamentável que o estudo socio-demográfico que revela os hábitos de consumo em locais de diversão nocturna esteja ainda por concluir. Sou fumador civilizado e concordo com a regulamentação do fumo em recintos fechados. Não obstante, avanço alguns dados:
1. Da nossa população activa, cerca de 42% não frequentam habitualmente discotecas, bares, pubs e afins.
2. Os clientes frequentes de bons restaurantes e clubes resumem-se curiosamente a algumas centenas de indivíduos e a incidência de fumadores é esmagadora. Os restantes não são representativos no volume de facturação dessas casas.
3. De facto em Espanha foi pequena a perda de clientes nas casas onde foi proibido fumar. Essa pequena parte eram os melhores clientes.
4. Em Itália é já sobejamente conhecido o fenómeno dos restaurantes de luxo que afixaram dísticos de "admissão reservada" para que os seus bons clientes possam fumar sem uma sombra denunciadora.
5. O intrépido clínico que tem tido tempo de antena a defender esta nova lei é um indivíduo que não contribui com um tostão para os bolsos dos proprietários que vêm os seus clientes a preferirem festas privadas. Mais: não fuma, não bebe e não fomenta a natalidade.

Na próxima noite de sábado ofereço um churrasco lá no monte onde deixei ficar uma palete de cohibas prós amigos. Volta e meia aparecem umas gajas nuas, que ainda é permitido. Bem hajam.