2007/03/27

Recapitulação

Sobre a discussão iniciada pelo AMN n'A Arte da Fuga, registo os seguintes contributos posteriores:

Quanto ao último artigo referenciado, e logo depois de confirmar que da minha parte não é preciso pedir desculpas nenhumas (afinal nós estamos aqui mesmo para isso, para discutir as coisas), neste diz-se:
A esquerda sabe que o veículo de qualquer mensagem política é a comunicação social, e também sabe como esta funciona. Os títulos dos jornais, ou as noticias de abertura de telejornais não se enchem com "meios" mas sim com "fins". Um "Partido X promete mais/melhor emprego/educação" será sempre escolhido em detrimento de um "Partido Y promete acabar com participações do Estado/obrigações sucessórias".
Daí que todos os "meios" (medidas) propostas pelo JLP teriam que ser veículadas como "fins" para captarem a atenção do público.
O problema da comunicação social é complicado, sem dúvida, sabendo-se como se sabe que em grande medida está controlada e povoada pela esquerda, e que vai patrocinando a sua agenda.

Mas, em relação à questão dos "meios" vs. "fins", é exactamente nessa clarificação que, quanto a mim, um partido liberal deverá insistir. Quando a esquerda promete fins como o "emprego" e a "educação", por exemplo, está a demonstrar o que as pessoas já se vão apercebendo: que vai prometendo exactamente o género de coisas em que o estado não deveria participar, e em relação às quais tem uma margem de acção e intervenção muito reduzida, já que não são actos de vontade.

Quando o (licenciado em engenharia) Sócrates prometeu os famosos 150000 empregos, essa promessa acabou em grande parte por ser vista imediatamente como demagogia por grande parte das pessoas, que tinham a clara noção que que não está no poder directo dele poder criar esses postos de trabalho (a menos que fosse na função pública, o que seria também criticado). Não está ao seu alcance, nem é uma coisa que se resolva por decreto ou por iniciativa directa política.

Assim como quando prometeu crescimento económico, tinha a noção que era uma coisa que não podia cumprir, uma vez que, a menos que fosse trabalhar ele próprio "para as obras", tal é uma tarefa da economia, e não do estado.

Esse género de discurso, das promessas, está completamente inquinado na opinião pública, e as pessoas estão progressivamente a despertar para a fraude que este sistematicamente constitui. Pior do que isso, as pessoas já se vão consciencializando que essas promessas lhes saem essencialmente do bolso, e que são cada vez mais impotentes para segurar o fruto do seu trabalho.

A propria aposta num discurso novo e fresco, longe desse paradigma, acho que só poderia ter a ganhar.

Um programa liberal tem portanto que se afirmar exactamente pelos "meios", as acções que podem ser tomadas concretamente pelo poder, como baixar os impostos, eliminar legislação ou remover o "time" do estado "de campo", e não elencando potenciais resultados ou "fins" dessa medidas. Tem que destacar as medidas pelas medidas, uma vez o Liberalismo, segundo o meu entendimento, não é uma ideologia de promessa por enumeração de resultados, mas sim do estabelecimento de um caminho melhor para que todos possam conquistar a sua felicidade.

14 comentários:

Anónimo disse...

Gostava de pensar que o que o JLP diz é verdade. Isto é, seria bom que os eleitores tivessem aprendido com as experiências do passado. Tenho dúvidas.

Em todo o caso, por que razão não tentar convencê-los de que é melhor pagar menos impostos do que ter uma educação miserável só supostamente gratuita? Se algum mérito um partido liberal pode ter é o de mudar o paradigma político em que vivemos. E não venham com tretas: não são os blogues, que, na melhor das hipóteses, chegam a 5% dos portugueses, que o farão.

Os blogues liberais são um modelo de difusão de ideias liberais gasto e com poucas ou nenhumas possibilidades de crescimento em termos de público alvo. A alternativa a um projecto político é o contentamento com a cada vez maior irrelevância política dos blogues liberais.

As minhas dúvidas são outras. Seria possível atingir alguma espécie de consenso entre liberalismos diferentes? Seria possível conciliar pessoas tão distintas como CAA e o AAA ou o Arroja? Acho que não. É por aí, pelas pessoas, pelos egos que a coisa falharia.

Anónimo disse...

Pegando no útil comentário anterior, eu diria que a coisa não falharia apenas pelas pessoas - que é, de qualquer forma, o sítio onde costumam falhar muitos partidos políticos.

A coisa falharia também porque muitas das pessoas estão convencidas de deter a Verdade e as Soluções Certas, as quais tipicamente foram aprendidas num conjunto de livros de autores já falecidos e que viveram noutros países. Essas pessoas estão então pouco viradas para debater com outras, para aceitar que as Soluções Certas podem de facto não ser as melhores aqui e agora, e para aceitar que surgem sempre problemas novos e imprevistos para os quais há que inventar novas soluções. Essas pessoas estão então pouco viradas para compromissos, pois que já sabem a Verdade toda e o melhor que podem fazer é apenas ensiná-la e impô-la aos outros.

Em suma, há muitas pessoas no liberalismo português que sofrem do mesmo mal dos comunistas: vanguardismo ideológico, leninismo.

O que não é estranho, se se tiver em conta que muitos dos atuais liberais portugueses têm um passado bem militante e bem rígido na área política comunista.

Luís Lavoura

Filipe Brás Almeida disse...

Bom post LL.

Não há nenhuma área política que sofre mais com desorganização e lutas ideológicas e programáticas internas do que o libertarianismo, esta área em Portugal segue o mesmo rumo. O individualismo é tanto que não conseguem aparentemente, e até ao momento, fazerem as pazes com o processo democrático em si. Faz-me lembrar de uma expressão do W.B Buckley (por quem não expresso qualquer tipo de simpatia): "Defendem e lutam pela liberdade de expressão mas chocam-se quando se deperam com o facto das outras pessoas terem opiniões diferentes."

No paradigma actual, um partido político, para se tornar viável na promoção e avanço das suas ideias, tem de se tornar viável nas urnas. Para se tornar viável nas urnas tem de se tornar antes de mais, num veículo capaz de transmitir uma mensagem política clara e compreensível ao eleitorado.

Julgo que é pouco provável, ainda menos razoável, e ainda menos desejável, esperar que o liberalismo irá saltar do papel, da blogosfera e de construções lógicas, para conquistar um nicho no eleitorado deste paísm, que nem a revolta do proletariado.

Não me parece que esta realidade se altera em função da quantidade de bloguistas libertários e liberais/conservadores sem vínculo partidário a postarem todos os dias na internet, diga-se a um ritmo quase supra-humano.

Filipe Brás Almeida disse...

pequena correcção: W.F. Buckley e não W.B.

JLP disse...

"Gostava de pensar que o que o JLP diz é verdade. Isto é, seria bom que os eleitores tivessem aprendido com as experiências do passado. Tenho dúvidas."

Pessoalmente eu acho que os eleitores se encontram num estado intermédio, em que pura e simplesmente deixaram de acreditar nos políticos e na política, mas que se sentem impotentes (e ainda não se estão para chatear) no que toca a arranjar alternativas.

O que não elimina o facto de que a violência do estado sobre a liberdade e os direitos cresça, e progressivamente possa mudar esse cenário.

"Em todo o caso, por que razão não tentar convencê-los de que é melhor pagar menos impostos do que ter uma educação miserável só supostamente gratuita? Se algum mérito um partido liberal pode ter é o de mudar o paradigma político em que vivemos."

Sem dúvida!

"Os blogues liberais são um modelo de difusão de ideias liberais gasto e com poucas ou nenhumas possibilidades de crescimento em termos de público alvo."

Cumprem a sua missão. Acho que ainda não são um modelo gasto, mas que naturalmente têm um papel limitado e longe de poder encabeçar por si só um projecto liberal que se pretenda virar para o universo dos eleitores.

"Seria possível atingir alguma espécie de consenso entre liberalismos diferentes? Seria possível conciliar pessoas tão distintas como CAA e o AAA ou o Arroja?"

Eu, contrariamente, acho que sim. Mas um consenso limitado. Naturalmente quanto mais pessoas se queiram "meter no barco" menor será o número de itens de um projecto político em que poderá haver consenso. Mas de qualquer modo, mesmo com esse consensos reduzidos acho que serão um passo de gigante em relação à realidade vigente.

JLP disse...

"O que não é estranho, se se tiver em conta que muitos dos atuais liberais portugueses têm um passado bem militante e bem rígido na área política comunista."

Fiquei curioso com esta afirmação, já que assim de repente não me ocorre nenhum. O Luís Lavoura poderia avançar alguns nomes?

Filipe Brás Almeida disse...

Não quero de forma alguma desrespeitar o LL e a resposta que ele possa dar, mas estou-me a lembrar do Pacheco Pereira e o seu antigo clube de liberais de esquerda, que eram na sua maioria incluindo o JPP, oriundos da extrema esquerda.

JLP disse...

"Bom post LL."

Caro Filipe Brás Almeida,

Acho que por enquanto (enquanto não for "colectivizado"), o post ainda é meu... ;-)

"Não quero de forma alguma desrespeitar o LL e a resposta que ele possa dar, mas estou-me a lembrar do Pacheco Pereira e o seu antigo clube de liberais de esquerda, que eram na sua maioria incluindo o JPP, oriundos da extrema esquerda."

Sim, mas isso é partir do princípio de que o JPP é um liberal. "Crime" que nunca lhe vi atribuído, nem que vi alguma vez reconhecer pelo próprio. Aliás, concordo plenamente que tal assim seja.

Anónimo disse...

Era só uma "boca", JLP. É que há aí alguns liberais que, sempre que não gostam daquilo que o adversário político está a dizer e não sabem retorquir com substância, lhe atiram à cara com acusações de ser comunista ou de o ter sido. Eu próprio já fui acusado disso por diversas vezes, aqui neste blogue e noutros. Ora, esses liberais esquecem-se de que o seu prórpio armário tem alguns esqueletos...

Exemplos: uma "joana" que tinha um blogue (aliás muito bom) chamado semiramis, um "pedro oliveira" que lá costumava comentar, o bem conhecido José Manuel Fernandes, o Pacheco Pereira. E haverá certamente muitos outros, reconhecem-se pela pinta leninista que, volta-e-meia e involuntariamente, neles assoma.

Luís Lavoura

JLP disse...

"Em suma, há muitas pessoas no liberalismo português que sofrem do mesmo mal dos comunistas: vanguardismo ideológico, leninismo.

O que não é estranho, se se tiver em conta que muitos dos atuais liberais portugueses têm um passado bem militante e bem rígido na área política comunista."

"É que há aí alguns liberais que, sempre que não gostam daquilo que o adversário político está a dizer e não sabem retorquir com substância, lhe atiram à cara com acusações de ser comunista ou de o ter sido."

Hum... :-D

Filipe Brás Almeida disse...

JLP, estava-me a referir ao post do LL mesmo.

Não houve equívoco e a não ser que isto já foi colectivizado, o post ainda é o do LL.

JLP disse...

"JLP, estava-me a referir ao post do LL mesmo."

Talvez "comentário"? ;-)

Filipe Brás Almeida disse...

Isso.

Anónimo disse...

JLP não quero ser uma devota do teu liberalismo. Acho que apesar de tudo tens alguma razão sou doutra geração em que lutavamos pela liberdade de expressão...Só agora estou a entrar nesta liberação de ideias. Mas aonde vamos nós chegar. Nunca fui filiada em nenhum partido graças...A mim. Por isso JLP acho que por alguns momentos me rendi a tua opinião. Não deixes de ter voz, nem que seja para eu te dizer continua em frente, chegaras a algum lugar, nem que seja o meu.