Confundido
Aparentemente, Daniel Oliveira continua seriamente confundido em relação ao Liberalismo. Vai daí, põe-se a fazer conjecturas, no caso personalizadas no João Miranda (mas que estende aos "neo-liberais que escrevem gratuitamente em blogs") sobre o que o faz correr, ou sobre como o acto de escrever "sem receber nada em troca" (ou "grátis", como diria os outros) não violaria a perspectiva sacrossanta das leis do mercado.
Sentindo-me visado, pelo menos face ao largo espectro que costuma ser atribuído ao conceito de "neo-liberal", não posso deixar de responder ao apelo e tentar elaborar sobre as três potenciais hipóteses que, segundo a perspectiva limitada do Liberalismo do referido Daniel Oliveia, poderiam justificar tão grave violação das leis do mercado.
A primeira hipótese avançada é a de que, se JM não recebe por escrever, o seu valor de mercado é nulo e a sua acção antieconómica ou impulsionada por um "voluntarismo socializante." Ora, meu caro, há por aí logo uma grande confusão, que é a de confundir valor de mercado com custo e/ou preço. Além disso, demonstra uma certa tibieza de avaliação do Liberalismo, como porventura achando que todas as iniciativas tomadas pelos indivíduos em Liberdade têm que ser feitas num qualquer "mercado" ou mesmo escrutinadas por critérios "de mercado" (e que não possam ser por exemplo meros caprichos dos seus protagonistas), em contrapartida sendo consideradas mero "voluntarismo socializante". Ora tanto a noção de valor da sua actividade do João Miranda lhe escapará (a menos que Daniel Oliveira consiga ler a sua mente), como lhe parece escapar o claro sucesso "comercial" do seu produto e visibilidade granjeado por este, em que aparentemente também imensos "fregueses" lhe parecem reconhecer suficiente valor. Assim como acaba por "promover" a "voluntarismo socializante" toda a forma de filantropia, mecenato ou movimentos perfeitamente liberais como o do Software Livre. Estará amanhã o Daniel Oliveira a perorar sobre o "voluntarismo socializante" do Blogger ao disponibilizar uma plataforma gratuita para blogs? Será que o valor de mercado do Blogger é zero?
As leituras sobre as diferentes perspectivas de valor ficam como exercício.
A segunda hipótese é um curioso exercício de esquizofrenia. Daniel Oliveira queixa-se que, se João Miranda (ou outro potencial "neo-liberal" de escrita gratuita) escreve enquanto está em funções (e recebe) do estado, está a "distorcer o mercado" ao ser "subsidiado pelo estado". Em primeiro lugar, constatamos com agrado que tenha concluído dos efeitos perversos e das "distorções" dos subsídios no mercado. Em seguida, só podemos constatar que DO tem estado desatento na leitura da opinião de JM: é bem conhecida, e reiterada em diversos artigos de sua autoria (bem como uma polémica antiga com muitos), a sua opinião de que um liberal que beneficie de subsídios ou explore o estado aproveitando da sua omnipresença e desmesura em benefício próprio não tem individualmente nenhuma obrigação moral de mudar o seu comportamento ou não deixa por isso de ser menos liberal. O que não inviabiliza nem retira o direito de publicamente defender que deveriam ser eliminados os subsídios ou as competências do estado limitadas. Ora, portanto, as queixas de DO deveriam ter outro destinatário que não JM, mas sim o estado. O mesmo estado que no exercício das suas funções (auto-atribuídas) de patrão e no exercício da sua função fiscalizadora permite que haja pessoas (eventualmente) como o JM a escrever para blogs no horário de serviço, sustentado pelo dinheiro de todos os contribuintes.
Resta a terceira hipótesa: a de que JM escreve gratuitamente para "valorizar a sua opinião", para que "possa vir a rentabiliza-la" e que os seus textos são "um investimento". Neste caso concreto, subsiste uma grande dúvida, concretamente qual das "leis do mercado" defendidas pelos "neo-liberais" (eu acrescentaria até, por qualquer um que defenda um mercado livre!) é que está a ser "violada"? Isso é errado por algum motivo?
O meu caso (ou de Helena Matos, Rui Tavares ou Pacheco Pereira) é absolutamente diferente. Escrevemos noutros lugares e os rendimentos recbidos permitem escrever gratuitamente em blogues.Em jeito de conclusão fica o comentário: é curioso que Daniel Oliveira confunda o exercício da Liberdade de Expressão com a produção de um "produto", e queira limitar (ou somente "ache justificado") o exercício da actividade de "comentador gratuito" aos que recebem pela mesma actividade de outro lado. Estará inseguro em relação ao que poderá transparecer ao seu empregador, quando este verificar que no meio de todo o comentário gratuito que prolifera, de pessoas desapegadas de vínculos e que arranjam pelos seus proprios meios (e vontade) maneira de o fazer, com clientelas fidedígnas, surja comentário de qualidade igual ou superior ao que paga?
Além disso, e para terminar, sinceramente acho limitada a perspectiva de DO de que só poderão ser três as hipóteses que justificam o sucedido. Estou a lembrar-me pelo menos de mais duas, entre muitas prováveis outras, que poderão justificar tanto a vontade como os proveitos retirados: o dar-lhe na telha e o chatear a cabeça ao Daniel Oliveira.
5 comentários:
Eu não disse que se fosse um investimento estaaria a ser violada alguma regra do mercado. Disse o contrário: "A sua situação só é compreensível se a terceira hipótese (a do investimento) for verdadeira.
"á por aí logo uma grande confusão, que é a de confundir valor de mercado com custo e/ou preço"
" Assim como acaba por "promover" a "voluntarismo socializante" toda a forma de filantropia, mecenato ou movimentos perfeitamente liberais como o do Software Livre."
"Estárá amanhã o Daniel Oliveira a perorar sobre o "voluntarismo socializante" do Blogger ao disponibilizar uma plataforma gratuita para blogs?"
"Em jeito de conclusão fica o comentário: é curioso que Daniel Oliveira confunda o exercício da Liberdade de Expressão com a produção de um "produto""
Chegamos onde queria: ver as vossas leis religiosas serem relativizadas por vocês mesmos.
Só faltou uma coisa: compreender o poder argumentativo da ironia. Nisso, o seu companheiro de armas RAF foi mais clarividente.
Fiz copy incmpleto de uma das suas frases. Escreveu "há" e não "á".
"Chegamos onde queria: ver as vossas leis religiosas serem relativizadas por vocês mesmos. "
Caro Daniel Oliveira,
Vejo que continua confuso. E que não fez o exercício.
Para dar uma ajudinha:
- A noção de "mercado" não envolve obrigatoriamente a transação de produtos por dinheiro. Poder-se-ia até dizer que tudo é afinal uma transação sustentada em endorfinas, sendo que o dinheiro consegue geralmente (mas não exclusivamente) fazer um mapeamento dessas ambições para a realidade que simplifica as transações.
- Posto isto, e a menos que o DO consiga, como referi, estar dentro da cabeça do JM ou da generalidade dos bloggers "neo-liberais", dificilmente poderá conseguir concluir sobre qual é a recompensa de que cada um usufrui, ou até se recebe por outras vias (privadas) meios para o fazer. A noção de mercado em nada fica deteriorada.
- Persiste ainda a dúvida em relação a qual "lei religiosa" foi relativizada ou violada pelos "neo-liberais" ao escreverem gratuitamente.
- O conceito de caridade ou filantropia é um conceito extremamente caro aos liberais, em oposição à solidariedade socialista. E daí?
- Aos liberais não cabe, geralmente a definição ou a defesa de "leis de mercado". O que defendem é que este deve ser essencialmente LIVRE de regras impostas externamente (não acordadas entre os seus participantes), limitando-se pelas regras do Estado de Direito, que mais não devem ser do que regras que defendam as liberdades negativas individuais e a propriedade. Serão essas sim as "leis religiosas" a que se parece referir, mas que não estão em discussão no seu artigo. É pois ainda mais estranha a acusação de violação de "leis" que os liberais defendem não dever existir.
"Só faltou uma coisa: compreender o poder argumentativo da ironia."
O problema é que a ironia é algo que não está sempre ao alcançe do autor e algo que se queira. É, sem, dúvida, algo que se consegue.
A coroar uma resposta de mestre,
Aos liberais não cabe, geralmente a definição ou a defesa de "leis de mercado". O que defendem é que este deve ser essencialmente LIVRE de regras impostas externamente (não acordadas entre os seus participantes), limitando-se pelas regras do Estado de Direito, que mais não devem ser do que regras que defendam as liberdades negativas individuais e a propriedade.
...estou de chapéu tirado.
Caro AA,
"...estou de chapéu tirado."
Não vale a pena, que já vai fazendo fresco pela noitinha... ;-)
Abraço,
JLP
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