2006/05/02

Insegurança social

Naturalmente tenho acompanhado com interesse a recente (e eternamente recorrente) questão das mudanças na segurança social, apesar de hoje não ter podido acompanhar o Prós&PrósContras sobre o assunto (apesar de suspeitar que não perdi nada de especial).

O que o estado tem vindo a fazer, desde que se instaurou o presente modelo de Caixa Geral de Aposentações (CGA) seria, se se tratasse de uma empresa privada ou de um fundo privado de pensões, há muito chamado de abuso de confiança e fraude. Foram estabelecidos regimes compulsórios de contribuições que abrangeram funcionários públicos e privados durante anos sendo que, agora que muitos construiram (longas) carreiras contributivas, se subvertem as regras e os pressupostos que haviam há muito sido estabelecidos com os aderentes a esses regimes.

É curioso que o argumento recorrente quando se fala na criação e exploração de fundos privados de pensões, de que estes estão sob o risco de colapsarem fruto da mudança da conjuntura económica ou de mecanismos especulativos mais excessivos, não seja paralelamente aplicado à gestão da CGA. O que aconteçe é que, face à ruina e à falência eminente do sistema público de pensões, atestado da incapacidade do estado em conseguir gerir, arcar com a responsabilidade da gestão e cumprir com os seus compromissos, o estado já se encontra em efectiva implementação de planos de contingência de contenção de danos, com efectiva destruição mais do que direitos adquiridos, de legítimas espectativas dos contribuintes da CGA. É que não esqueçamos que a CGA não é alimentada na sua generalidade pelos impostos, mas sim por contribuições dedicadas dos trabalhadores, não se tratando a questão de um problema de "redistribuição da riqueza" ao sabor das cores do governo no poder, mas sim do respeito das "condições contratuais" de um serviço que o estado optou por prestar, optando também por estabelecer o seu monopólio e a sua compulsividade.

E persiste-se no erro, com unhas e dentes.

Quando em termos civilizacionais seria de esperar que o aumento da produtividade laboral dos povos conduzisse a aumento do bem estar e do número de anos de usufruto das reformas, já que seria de supôr que o aumento da esperança de vida seria equilibrado pelo aumento da produtividade e do nível de vida, de modo a que com mais (ou até menos) anos de serviço e carreira contributiva se conseguisse assegurar mais anos a beneficiar da reforma, este governo vem assumir assim a derrota civilizacional de um modelo de estado que agora vem exigir, basicamente, que se prestem mais anos de trabalho e de descontos para assegurar os mesmos anos de reforma.

Urge, pelo menos, acabar com o regime de obrigatoriedade de desconto para a CGA. Correndo-se o risco de se tal não for feito, irmos assistir de camarote ao estado a continuar a dar as suas provas de gestão ruinosa (e danosa), que culminarão na previsível revolta social quando acabar o dinheiro para os palhaços.

De um ponto de visa liberal seria de todo justo e prioritário adoptar de imediato um cenário que deveria, quanto a mim, passar por:

  • Estabelecer um valor fixo de reforma alimentada pela CGA, eventualmente no cenário presente alinhada, por exemplo, com o valor do Rendimento Social de Inserção. A contribuição para a CGA seria desse modo de valor fixo, e não proporcional ao rendimento.
  • Para os actuais contribuintes que já tenham com a sua carreira contributiva assegurado a capitalização necessária para o pagamento dessa reforma fixa durante um número de anos igual à duração esperada (média) da reforma, devolver o capital excedentário (acrescido da respectiva capitalização).
  • Terminar com o regime obrigatório de contribuição para a CGA, para além deste valor fixo.
  • Liberalizar a idade da reforma, definindo somente valores alvo de capitalização por duração da carreira contributiva (i.e. definir para cada duração da carreira contributiva qual o valor de capitalização que o beneficiário da reforma teria que assegurar para ter direito à reforma fixa). Nada deviria impedir, por exemplo, que alguém se podesse reformar aos 50 anos, assegurando maiores descontos.
Seria deste modo assegurada uma transição "suave", e ficariam salvaguardados os requisitos de sobrevivência de todos os que descontassem para a CGA, bem como seria estabelecida uma reforma mínima assegurada pelo estado que agiria como safety net caso as reformas privadas constituídas por iniciativa de cada um sofressem algum revés.

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